Viseu uma década perdida (Parte I)

Este modelo de desenvolvimento, conservador, vigente ao longo da última década, tem perpetuado algumas das elites dominantes mantendo quase todos os seus privilégios inalterados: uma classe rentista, avessa à mudança de paradigma, mas apesar de tudo cada vez mais envelhecida e bolorenta.

  • 10:32 | Quarta-feira, 06 de Janeiro de 2021
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Há um conjunto de indicadores que ao longo dos últimos dez anos têm registado valores preocupantes e que reforçam a ideia de atraso de desenvolvimento e de empobrecimento no concelho de Viseu. Esta realidade insofismável pode ser aferida através de diversos indicadores como são o caso do índice de poder de compra, do nível médio dos salários, ou ainda do envelhecimento da população associado ao próprio e progressivo despovoamento do concelho.

Este empobrecimento tem sido um dos argumentos mais fortes para que muitos jovens – que terminam o ensino secundário no concelho e que depois ingressam em universidades de Lisboa, Porto, Coimbra, Aveiro, Covilhã e até Évora e Faro – acabem por nunca “regressar à terra” que os viu nascer e crescer até à maioridade.

A sua falta – lida como o seu não regresso – acaba por ser uma das principais razões do atraso do Concelho, uma vez que a sua energia criativa, capital acumulado, conhecimento adquirido, seriam a chave fundamental para reverter esta trajetória de perda, do empobrecimento de Viseu e do seu atraso de desenvolvimento.


Ao mesmo tempo que a maioria dos “filhos da terra” acaba por não voltar, as poucas oportunidades de trabalho criadas, traduzem-se, regra geral, por trabalho mal pago, com salários baixos. Muitas dessas oportunidades acabam por ser preenchidas por jovens e menos jovens, vindos de outras paragens, muitos deles imigrantes, com menos qualificações, mas sobretudo mais dispostos aceitar “as regras” de trabalho mal remunerado e com menos direitos. Importa, também, notar que o nível de ofertas de trabalho, para além de serem mal remuneradas, acabam por ser menos exigentes do ponto de vista das qualificações, bastando em muitos casos apenas a conclusão do 12º ano, dispensando dessa forma qualificações de nível superior.

Este modelo de desenvolvimento, conservador, vigente ao longo da última década, tem perpetuado algumas das elites dominantes mantendo quase todos os seus privilégios inalterados: uma classe rentista, avessa à mudança de paradigma, mas apesar de tudo cada vez mais envelhecida e bolorenta.

Importa, pois, explorar e contextualizar – em números – as razões deste atraso. No resto desta 1ª parte do texto, procurarei apresentar alguns desses indicadores, que mostram que nestes últimos 10 anos nada mudou para melhor, pelo contrário, perdeu-se a oportunidade de uma década de desenvolvimento.

A perda de poder de compra – como indicador de bem-estar material das famílias – é um deles, e nestes 10 anos (2007/2017) começa por registar uma recuperação entre 2007 e 2013, passando de 91,9 para 96,6, contudo a partir dai caiu para valores de 94,4 no ano 2017.

Importa notar que a leitura destes números faz-se tendo como referência o valor de 100 que corresponde à média do indicador em termos nacionais. Dai que se possa afirmar que entre 2007 e 2013 os Viseenses viram convergir o seu nível de vida com a média nacional e que a partir dai o processo é exatamente o oposto divergindo, isto é, as famílias de Viseu ficaram mais pobres quando comparadas com o resto do país.

Este indicador, publicado de dois em dois anos (espera-se no 4º trimestre deste ano a publicação dados de 2019), apesar de algumas limitações, não deixa de ser um instrumento valioso para avaliar as condições de bem-estar das populações, quer através da sua análise comparada entre concelhos, quer englobado com outros indicadores, como é o caso do valor dos salários médios pagos, do qual falarei numa segunda parte deste texto, a publicar brevemente.

Da análise do Índice do Poder de Compra (IPc) importa registar que durante todo este período os Viseenses tiveram sempre um nível de poder de compra abaixo da média nacional, isto é, foram sempre mais pobres que a média dos portugueses. Se compararmos os valores de Viseu com aqueles que se registaram com as demais capitais de Distrito verificamos que Viseu ocupava em 2007 o penúltimo lugar do ranking das 18 capitais de distrito – com pior poder de compra -ficando só atrás de Viana do Castelo. Era assim em 2007, continuava assim em 2017. Contudo, importa reter que no caso de Viana do Castelo se verificou um crescimento muito significativo do IPc passando de 88,4 pontos para 93,1 pontos, o que se traduziu num aumento de 4,7 pontos. No caso de Viseu esse crescimento foi sensivelmente metade do registado quer em Viana do Castelo, quer na Guarda.

Como disse atrás, são de esperar números novos com dados de 2019 – a publicar pelo Instituto Nacional de Estatística – no 3ºtrimestre deste ano. Não será surpresa nenhuma se Viseu passar a ocupar o último lugar da lista, o que reforçará a perceção do fracasso total das políticas públicas desenvolvidas nos últimos anos, o que nos obrigam a refletir seriamente sobre o futuro e o desenvolvimento do nosso Concelho.

 

 

Alexandre Azevedo Pinto (Economista)

(Fotos DR)

 

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