Já dei para o santo

O que eu não quero é um país que lambuze as minorias e se babe com tudo o que é desigual, como se essa condição fosse currículo, honra e glória. Ou tivesse de ser vantagem.

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  • 17:29 | Segunda-feira, 05 de Maio de 2025
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A opção pode ser boa ou má, conforme o prisma por que se olhe para ela. É como o copo meio cheio ou meio vazio. Calha, porém, que o tempo é descabido, despropositado, infeliz. Sabe a aproveitamento e a pouca convicção.

Inteirado de que a maioria da população tem sérias reservas quanto à imigração sem regras – eu também as tenho! – e repudia o modo como muito imigrantes pretendem impor os seus costumes, em prejuízo dos nossos usos, o governo tratou de mostrar poder. Torna-se evidente que o objectivo é retirar espaço ao Chega, para onde convergem muitos descontentes com o estado da arte. Esvaziá-lo nessa causa, tirar-lhe o brinquedo, inspira a acção musculada. O governo, animado pelas sondagens, e convencido de que a escolha lhe dará ainda mais votos, apostou numa deriva autoritária, acelerando o processo de regresso às origens. E, porque o tempo é de votos, não foi de modas, e investiu no que parece ser uma cedência à extrema-direita. Verdade. Cuidasse o governo de outras oportunidades, e livrar-se-ia de críticas partidárias, que valem o que valem, pouco, e não o afectam. Mas o governo, no geral, leu bem a situação. Tomou o pulso aos portugueses e constatou o óbvio. Há muito desconforto, muita indisposição, na sociedade, longe e à margem das tarjas e dos megafones que descem as avenidas icónicas das duas grandes cidades. Silenciosos, calados. Temos de ser abertos, tolerantes – concordo! – , mas não podemos fazer da inclusão um dogma, um valor absoluto. Sim, só porque sim. Prefiro pensá-la no condicional. Sim, se. Se vier colmatar necessidades nacionais, se tivermos capacidade de alojar quem vem, se que quem chega estiver predisposto, sem renegar origens, hábitos e crenças, a sujeitar-se a um processo saudável de aculturação.

O que eu não quero é um país onde os nacionais sejam ilhas e tenham medo de dizer o que pensam sobre essa matéria. O que eu não quero é que me batam à porta a impingir religiões. O que eu não quero é que o meus país aceite que terceiros façam o que a mim me impede. O que eu não quero é um país focado nas minorias, desleixado com as maiorias. O que eu não quero é imigrantes que me tratem mal, e, se eu reagir, venha logo a charanga das esquerdas chamar-me de racista e de xenófobo. O que eu não quero é ser o bombo da festa, quando invectivo asneiras e abusos. O que eu não quero é que um imigrante seja um labrego e, porque faz parte de uma minoria, venham logo os sacerdotes vanguardistas protegê-lo e dar-lhe mimos. O que eu não quero é um país que faz manifestações quando um negro, infelizmente, é assassinado, e se encolhe quando a mesma desgraça acontece a um branco. O que eu não quero é um país de joelhos perante os outros e prepotente com os seus. O que eu não quero é um país que trate igual o que é diferente. O que eu não quero é um país emprestado, um país a fingir, um país pendurado num estendal de indignidades. O que eu não quero é um país com razões de sobra para andar permanentemente zangado. O que eu não quero é um país que, nas escolas, tenha dietas islâmicas para os alunos muçulmanos, e aos alunos naturais sirva pratos que mais parecem vianda. O que eu não quero é um país que lambuze as minorias e se babe com tudo o que é desigual, como se essa condição fosse currículo, honra e glória. Ou tivesse de ser vantagem.


Apesar disso, não acompanho o discurso tonto de que não podemos dar aos outros o que é para os nossos, porque são os outros que fazem muitos trabalhos de que os nossos, elegantes e fidalgos, sentados confortavelmente no subsídio de desemprego e no RSI, alinhando com as economias paralelas, fogem como o diabo da cruz. Se este meu pensamento é de direita, do centro ou do vértice da circunferência? Tanto me faz. Não quero saber. Já dei para esses santos. Estou-me nas tintas para o juízo que fizerem sobre o que penso. Não vou atrás de emblemas. Os que tive, areei-os, e desfiz-me deles, dei-os a um latoeiro, para os leiloar na quermesse da feira da ladra.

Pois bem, 18.000 irão receber ordem de expulsão, e quem não sair em 20 dias será detido. Normal. E porque não? Se eu desobedecer às autoridades, se eu estiver ilegal, o que é que me acontece? Detido! Ah, esqueci-me de um detalhe fatal. Faço parte das maiorias que tudo toleram, aturam e consentem. Moles, mansas e frouxas.

Por último, chamar a esta operação “deportações à Trump”, como a cataloga o pasquim, é um exagero cómico. Os portugueses têm uma tendência congénita para exacerbar, para, de certa maneira, efabular. Embora normal, não deixa de ser estranho. E descabido.

PS – Para meu completo desânimo, duas semanas pela frente a levar com a propaganda eleitoral, uma xaropada de 5.ª categoria, pior do que o óleo de fígado bacalhau, que o saudoso Dr. António Xavier nos enfiava, à colherada, pela goela abaixo.

Já é tempo de nos livrarem deste pesadelo. Alguém civilizado que se lembre de rever esta legislação caduca.

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Publicado em Opinião