Estado do tempo

Durante muito tempo, não prestei atenção ao início meteorológico dos anos. Sorria à crença de que os doze primeiros dias de Janeiro antecipam o calor, o frio e a luz de cada um dos meses seguintes. Depois, observei o modo como Belisário Pimenta e Albano Coutinho escrevem as impressões do dia de Ano Novo. Soube […]

  • 13:08 | Domingo, 08 de Dezembro de 2019
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Durante muito tempo, não prestei atenção ao início meteorológico dos anos. Sorria à crença de que os doze primeiros dias de Janeiro antecipam o calor, o frio e a luz de cada um dos meses seguintes. Depois, observei o modo como Belisário Pimenta e Albano Coutinho escrevem as impressões do dia de Ano Novo. Soube de um homem que manteve toda a vida, sem falhas, o registo diário do estado do tempo no Peneireiro (Anadia).

Não escondo que esta curiosidade inútil começou em Maio de 1982, quando comecei a trabalhar nas termas da Curia e retive na memória as quatro semanas de chuva e vento que descabelavam as árvores do parque. Depois, cruzei-me com as crónicas de Albano Coutinho, da década de 1880, no jornal O Povo de Aveiro. Com uma admirável cadência semanal, este vitivinicultor de Mogofores enviou as suas crónicas sociais, económicas e políticas. Às vezes, falava de meteorologia. Dava-lhe uma importância que, pensando bem, testemunhei desde a meninice.

Quando a água corria nas valetas, pousava nelas dois pauzinhos e seguia-lhes o percurso atribulado para ficar a conhecer, sobre uma meta imaginária, o vencedor da corrida. Nesses dias, a chuva espalhava humidade no chão e nas paredes da mercearia e taberna dos meus pais. Os homens, que deviam estar nas terras a trabalhar ou em casa a arrumar a lenha, chegavam-se ao balcão a insultar a intempérie. E as mulheres, coitadas, sempre com as lides domésticas, aproveitavam a falta de colorau, azeite ou açúcar para trocar dois dedos de conversa e lamentar a frieza invernal que lhes tolhia a força e a vontade.


Nuno Rosmaninho

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Publicado em Opinião