Para abertura do Ser+Cultura

Nota: Começou ontem o Ser+Cultura de Sernancelhe. às 18H15 o Auditório já não comportava mais público. Competiu-me dizer umas palavras. Aqui vo-las deixo… Em “O Servo de Deus e a casa roubada” sobre o Milfomes, metáfora do filho da madre natura e do beirão lutador na sua intrínseca estrutura, Aquilino, com 5 adjectivos, numa pincelada […]

  • 10:30 | Sábado, 28 de Junho de 2014
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Nota: Começou ontem o Ser+Cultura de Sernancelhe. às 18H15 o Auditório já não comportava mais público. Competiu-me dizer umas palavras. Aqui vo-las deixo…
Em “O Servo de Deus e a casa roubada” sobre o Milfomes, metáfora do filho da madre natura e do beirão lutador na sua intrínseca estrutura, Aquilino, com 5 adjectivos, numa pincelada magistral, assim o pintou:
A sua fisionomia era a da própria serra, tendo a alegre e descuidada fleuma da água perdida pelos chavascais, a ligeireza sem causa nem rasto de vento, a frugalidade dum láparo, o ardil do raposo e em certas ocasiões, a ferocidade do lobo.
SENHORAS E SENHORES… Sejam bem vindos!
Mudados os tempos e numa galopada célere da Inácia, vir a Sernancelhe, beber da taça da Cultura, é façanha, que de tanto se cumprir, no sangue em vício s’ encruzou.
E sempre a falar Aquilino aqui mais vos diria que “o pouco de exultação que o português encerra em sua alma submissa gosta de expandi-lo no caminho da romaria ou no adro da ermida, depois das sete voltas sem fala ao padroeiro a pagar-lhe o voto…”
Pois cá estamos nesta imensa romaria que vai dar que falar, em busca de exaltação, neste adro tão de História e séculos adornado. Sete voltas lhe acometeremos e se o rédito não for tença que a S. Pedro ofenda, outras sete lhe daremos.
Eis-nos aqui para lobrigar mais que as sete maravilhas; para ouvir um cento de sínfonas melodias e para provar uma resma de iguarias…
E porém, a urbanidade que aqui vimos sorver como umaambrósia que faria morrer de gozo a velha de Esopo (…) não se criou nas faldas do monte de Freixinho com o cisco da erosão das rochas, com os vapores que sobem do Távora, com o sol que se aninha ali como galinha choca no ninho– parafraseando Aquilino – Esta urbanidade, dizíamos, é uma arte que escorre da serra, no vale se tempera e aqui é servida com a graça beiroa há décadas ressurgida.
O Criador é justo e da serrania sáfara de onde se ergueu o Milfomes de ontem, em 7 décadas corridas, a cavadelas sábias de ânimo firme, nos deu os Sernancelhenses de hoje, orgulhosos anfitriões nesta sua solidária e franca arte de bem acolher.
Estamos pois em casa de gente pródiga e boa… cumpra-se a romaria mas não sem que aqui se semeie este excerto de “O Homem da Nave” que assim, ao contexto declara:
Na roda do tempo, o mês de S. João é para a Agricultura um mês definitivo. Cai a 21 o solstício do Verão, por isso denominam a Junho as dobradiças do ano. Mais do que isso, pode considerar-se um ferrolho e de sete cadeados. Ou as arcas se enchem, ou temos as vacas magras do Egipto. (…)
Simultânea a este ácume agrícola, temos a quadra das maravilhas. A serra, a pobre serra de manto de estamenha, torna-se um jardim sonhado. As plantas rasteiras, tojo, urze, sargaço, bela-luz, rosmaninho, compõem-lhe, com o esplendor das suas tintas, uma ‘robe’ como de sorte teve essa Isabel II de Inglaterra, para quem trabalharam todas as boas fadas do Mundo. A barra está nos giestais que vestem os caminhos de amarelo espampanante, polvilhado duma que outra faísca de alvura. E, para o símile ser completo, imagine-se que o corpete é estampado com a matiz dos soutos e das moitas, que vai do verde-bronze ao ametista vaporoso.
Além de jardim, a terra é um coreto. Um coreto do tempo das filarmónicas rurais, notáveis em cobres e pancadaria, que tanto alegravam as festas ribaldeiras. Pela vitória da de Sernancelhe, nos desafios sertanejos, conjurava-se a comarca inteira e davam-se sarrabulhadas heróicas, dignas da Odisseia e do Hissope.
Passemos à volta seguinte…

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Publicado em Editorial