"O Senhor dos exércitos proteja a entrada e a saída deste templo" *

Se eu fosse político partidário, daqueles que vivem da “coisa” e nada são fora dela, no seu dialecto exausto, começaria por vos escrever a narrativa de hoje explicando que esta nova palavra em moda pode ter diversos significados mas, fundamentalmente, quer dizer isto: história + discurso = narração. Ou, segundo Genette, “acto de relatar enunciados”, […]

  • 12:22 | Segunda-feira, 09 de Março de 2015
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Se eu fosse político partidário, daqueles que vivem da “coisa” e nada são fora dela, no seu dialecto exausto, começaria por vos escrever a narrativa de hoje explicando que esta nova palavra em moda pode ter diversos significados mas, fundamentalmente, quer dizer isto: história + discurso = narração. Ou, segundo Genette, “acto de relatar enunciados”, ainda como modo de uma tríade (lírica, narrativa, drama) ou, citando Labov, “um método de recapitulação da experiência passada que consiste em fazer corresponder a uma sequência de eventos (supostamente) reais uma sequência idêntica de proposições verbais”.
Será por isso que “eles” começam desta forma: “A narrativa de hoje…”
A Via Sinuosa é um maravilhoso romance do políptico semi-autobiográfico, publicado por AQUILINO em 1918. Dedica-o assim: “À memória de meu pai, Joaquim Francisco Ribeiro”, que aparece na “narrativa” como o Padre Ambrósio e o autor, no seu alter-ego semi-ficcionado, como Libório Barradas…
…Barradas como o toante sino da Igreja do Espírito Santo, no Carregal (onde AQUILINO viu vida) rodado ou roubado do convento de Caria ou Paço dos Bularios, hoje a Quinta do Ribeiro, ao cruzamento de S. Francisco, vindos de Soutosa e rumando a oriente, levante ou leste.
Celidónia Violas a “amorinha” de Libório por ali perpassa sua rebelde índole… Estefânia Malafaia a sua sensualidade esfuziante, a fidalga de Santa Maria das Águias que reviravolteou a cabeça de Libório…
Bom, leiam a obra que só têm a ganhar com isso. Eu já a li meia dúzia de vezes e só dei azo ao dito latino: “bis placenta repetita”…
Hoje fui a Alhais, à Igreja Matriz da Nª Sª da Corredoura, traço pesado e pouco inspirado do gaulês Granjou, onde Aquilino foi registado.
Penitenciei-me no Convento de S. Francisco, minuciei-me ruínas afora e avelanais adentro, saí pelo Arcozelo e às espaldas de S. Torcato desci quase a Tabuaço e mergulhei no Mosteiro de S. Pedro das Águias, cisterciense, masculino, um eremitério íntegro, junto a um vale escarpado onde se remansa o Távora (“Bernardus valles amabat”).
 
 
Relata a lenda que ali se refugiou a princesa moura Ardinga para desposar D. Tedão (erradamente apodam-no de D. Tedo), cavaleiro cristão que lhe roubara o afecto e o sentido. Aí seu pai, o bárbaro emir de Lamego, a matou por suas mãos…
Voltei na sinuosidade afora até à albufeira do Vilar. Deixei Vila da Rua onde a fonte de S. Francisco de outrora goteja hoje sua linfa. Ainda pensei ir ao Freixinho, às cavacas da Nª Sª do Carmo, mas o tempo a fugir mas roubou. E o ímpeto também me tolheu e ordenou ao largo…
AQUILINO é, ainda hoje, o mor guia das Beiras.
Mas há que lê-lo… e depois das suas 72 “narrativas”, entre romances, contos, novelas, literatura infantil, história e literatura, biografia, hagiografia, tradução, teatro, ensaio, diário, monografia… vestir enfim a capa de pelica, arminho sobr’ombros e sem psitacismos ocos ser, então, de confiduciado capelo no bestunto, aquiliniano de impávida e genuína gema…
 
* Inscrição em latim na porta lateral da Igreja/Mosteiro de S. Pedro das Águias.

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