O baú das memórias

Hoje, não sei porque excepcional coincidência veio-me às mãos uma velha notícia acerca do Parque Mayer… Daí desencadeou-se o turbilhão da memória e recuei a 1974 ou 75. A convite de um amigo de meu pai, o Eduardo Costa, o Dádá para os íntimos, o “Príncipe” para a Beatriz Costa, assim chamado num dos seus […]

  • 13:56 | Segunda-feira, 12 de Janeiro de 2015
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Hoje, não sei porque excepcional coincidência veio-me às mãos uma velha notícia acerca do Parque Mayer…
Daí desencadeou-se o turbilhão da memória e recuei a 1974 ou 75.
A convite de um amigo de meu pai, o Eduardo Costa, o Dádá para os íntimos, o “Príncipe” para a Beatriz Costa, assim chamado num dos seus livros, grande Senhora que ainda tive oportunidade de conhecer no Hotel Tivoli, fomos a Lisboa à estreia de uma comédia, “Mostra-me a tua piscina”, creio que da responsabilidade do Vítor Espadinha e com a encantadora Lídia Franco.
Imaginem a excitação de um ganapito que das berças ia a Lisboa, ficava hospedado na Pinheiro Chagas e andava num imponente Maserati (em dois tons de cinza metalizado) pelas avenidas nocturnas da cidade…
Eu usava a minha primeira e incipiente barba. À Che, claro! O Eduardo sempre impecavelmente vestido, o meu Pai, “o tio Álvaro, todo galante e eu com umas imensas calças à boca de sino e uma indumentária colorida que hoje me faz sorrir de quase pudor.
Entrámos pelos portões principais do Parque Mayer que só se abriam aos carros dos artistas e empresários com uma rasgada chapelada do porteiro (toda a gente na noite lisboeta gostava do Senhor Eduardo Costa!), fomos jantar ao Gato Negro (ou Gato Preto?) onde a Fernandinha, a dona, que curiosamente era dos Alhais nos tratou como a viscondes.
De seguida, o Eduardo mandou um empregado à bilheteira comprar um camarote. “Que estava esgotado!” Veio a notícia. Mas esgotado era palavra que não existia no léxico dele. Lá fomos ao camarim da Lídia Franco que recebeu carinhosamente o Dádá (lindíssima e talentosa artista) e entre muita afável conversa, alguns cigarros e uns copos de whisky, com aquela inesgotável simpatia e vitalidade, lá arranjou o desejado camarote, decerto daqueles que eram para usufruto dos amigos dos protagonistas da peça.
Em palco havia uma imponente piscina num plástico transparente onde, durante toda a comédia nadavam nuas umas sílfides muito loiras… Para o adolescente Paulo Neto, fascinado, foi o que ficou da peça… aqueles esculturais corpos desnudos. Por muito tempo, podem crer…
Acabado o espectáculo a festa continuava, fados no Faia, ou no Painel do Fado, que era do próprio Eduardo, Ad-Libitum e depois ainda se passava pelo Tamila Clube, na Duque de Loulé… A noite acabava ao raiar da aurora e era frenética, agitada, excitante. Uma novidade para os meus olhos deslumbrados que na mesma noite conheceram Alfredo Marceneiro, Hermínia Silva, Maria da Fé, Nicolau Breyner…
O Eduardo já não está entre nós. Meu Pai também não. Lisboa tinha um encanto, uma fervilhante agitação, personagens de romance magníficas, bons-vivants de fantasia, gente boémia que tratava por tu a noite e a quem a noite respeitava…
Ou eram os meus olhos de adolescente que assim a viam e a minha memória esbatida que mo recorda?
(foto DR)

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