A comunicação do esquecimento

Na edição on line da revista do “Expresso” vinha um interessante artigo da Clara Ferreira Alves, intitulado “Silly Season“. Nele é abordada a rapacidade jornalística, sempre em busca da notícia congelada de tão fresca, cuja temática no dia seguinte e pós-sensação é de todo abandonada, tornando inconsequente e sem valor toda a diacronia dos factos […]

  • 15:41 | Domingo, 26 de Julho de 2015
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Na edição on line da revista do “Expresso” vinha um interessante artigo da Clara Ferreira Alves, intitulado “Silly Season“. Nele é abordada a rapacidade jornalística, sempre em busca da notícia congelada de tão fresca, cuja temática no dia seguinte e pós-sensação é de todo abandonada, tornando inconsequente e sem valor toda a diacronia dos factos e esquecendo o jornalismo de “investigação aturada, opinião, reportagem…”
Escreve a cronista o que se transcreve com a devida vénia:
Uma notícia afoga a seguinte, inunda-a da água em remoinho da novidade. Como aves de arribação, os jornalistas desembarcam todos no mesmo lugar da crise aguda, e desembarcam assim que se torna crónica, gerando o desinteresse colectivo. A isto chama-se, no jargão, comportamento de matilha, responsável pela repetição ad nauseam das mesmas histórias, escritas e reescritas ao espírito do tempo. Nunca chegamos a ver a continuação do filme, e muito menos o fim. E não queremos ver. O jornalismo perdeu a capacidade de atracção, o suspense, o crescendo da história e o seu remate.”
 
O imediatismo dos nossos dias conduz à superficialidade das aparências. Não é determinante percepcionarmos a causa/efeito dos factos, mas apenas o facto em si enquanto efémero e pulsante.
De certo modo o jornalista escreve o que o público quer consumir, na relação básica e imediata com o seu gosto. E isto reflecte-se directamente nas vendas, e ao fazê-lo, em função dos gostos do público-alvo atingido, o “share”, o indicador quantitativo e qualitativo das audiências vai atrair ou repelir a publicidade, o real modo de sobrevivência do “hoje-em-dia”.
Quem não se lembra a nível local da LUSITÂNIA, ADR, e da vergonha e escândalo que enferma pela opacidade que reveste a delapidação inexplicada de 25 milhões de euros. O Rua Direita, o Viseu Senhora da Beira, a Tribuna de Viseu já por várias vezes têm tentado re-atrair a atenção pelo assunto… que morre sempre de praia à vista até e também com os silêncios de comunidades intermunicipais, e etc. Na CMV, os seus proverbiais “inconseguimentos” já são naturais de tão vezeiros. A mítica estrada Viseu-Coimbra. A linha férrea Aveiro-Viseu-Vilar Formoso. A ausência de respostas para a crise de desertificação do interior, para o decréscimo demográfico, o desemprego jovem, a emigração, a diminuição exponencial de alunos no ensino superior. Os miríficos lóbis em torno de empresas locais (ou não). A Expovis e seus mistérios. A criação do CERV e seus desígnios. Os comércios que todos os dias fecham e a indústria que não vem. A futura “golpada” da previsível privatização das águas. A brutal dívida da CM Lamego, concelho do distrito empenhado por decénios. As Águas do Planalto…
Mas se sairmos do âmbito regional, e a nível nacional, o caso BPN é paradigmático do muito que caiu no esquecimento. Outro é, aleatoriamente, a CRESAP e suas consequências e critérios. Quem manda hoje na CS e quem redireciona as constantes notícias num voltigear incessante de carrossel? Os milhões a bombear para o ensino privado. Os lóbis da Igreja permissiva e ajoelhada que os políticos trazem no andor como se fosse um santo Antoninho. A degradação contínua da Saúde e o aniquilamento do SNS em favor dos privados. O caso Sócrates, para além do sensacionalismo bacoco. Os roubos feitos aos portugueses em impostos. Os swaps, os vistos Gold, as PPP’s. As gestões desastrosas da banca pública e privada. A cumplicidade silenciada do Banco de Portugal. O aumento do desemprego em Portugal. O aumento da dívida. O aumento dos suicídios e da violência doméstica. As mentiras de um governo apenas hábil de labieta e no teatro. O estranho e nunca dilucidado caso da Tecnoforma. Os temíveis assomos ilegais do “fisco”. As “mordomias” legais de Ricardo Espírito Santo… e um infindar de temáticas abordadas, mal ruminadas e deixadas cair, neste Portugal e neste mundo prenhe em novidades todos os dias mais novas e num crescimento desmesurado da “infantilização” do leitor — com as devidas excepções — mais dado a Fado, Futebol e Fátima do que à realidade profunda de um país que se desmorona ou esboroa sob os dedos hábeis e prestes daqueles que têm exacta e cirurgicamente essa função…
 

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Publicado em Editorial