Soube que se chamava Maria José, porque a minha tia Esmeralda lhe chamava carinhosamente Zeca, mas na aldeia todos a tratávamos por Trinta.
A Trinta era uma mulher alta, magra, de cabelos brancos e com os olhos azuis da cor do mar que nunca viu. Vestia sempre de preto e com um lenço na cabeça como era costume das mulheres alvitanas daquela época. Vivia sozinha numa casinha humilde no largo da Tulha, mas que era o balcão do salão dos espectáculos nos dias de festa.
As escadas e a varanda da Trinta eram disputadas sobretudo pelos mais idosos para se poderem sentar enquanto apreciavam o bailarico e o desenrolar de tudo o que se passava no largo da Tulha nestes dias de folia.
A casa da Trinta era um lugar especial, assim como especial era esta mulher… Quantos amores se iniciaram e se desfizeram nas escadas e na casa da Trinta? Quantos recados, cartas e bilhetes ela transportou entre namorados ou candidatos a namorados? Quantos encontros ela apadrinhou de apaixonados contrariados pela família dentro da sua humilde mas sempre limpa casinha? Quantas cartas de amor não foram escritas na mesinha da sala que também fazia de quarto onde nos podíamos esticar numa cama sempre impecavelmente limpa? Quantas lágrimas e desabafos ficaram enterrados naquelas paredes que já não existem?
A Trinta não tinha idade porque ela negava-se a envelhecer…
Ondina Freixo