Elvas, cidade património mundial, voltou a ser notícia por motivos que deviam envergonhar qualquer responsável.
A Câmara Municipal decidiu avançar com um conjunto habitacional de 87 fogos na Quinta de Santo António na freguesia da Terrugem e não se deu ao trabalho de respeitar que o local é arqueologicamente relevante. Vestígios de ocupação romana, incluindo uma colher de prata do século VI com inscrição paleocristã, foram literalmente enterrados em nome da urgência habitacional.
O Instituto Português do Património Cultural considera a situação uma violação clara das normas de preservação mas isso pouco importa perante o imperativo da construção rápida. O que vemos é um progresso imediato que atropela o passado e, no fundo, quem sofre é a identidade da cidade.
Como historiador, não posso permanecer indiferente. Cada sítio destruído sem estudo arqueológico é uma lição que não poderemos ensinar às gerações futuras. Conhecer o passado não é um luxo, é uma obrigação cívica e cultural. Ver séculos de história serem sacrificados em nome da urgência habitacional é revoltante e demonstra uma visão curta e imediatista daquilo que deve ser prioridade numa cidade que se orgulha do seu património.
É urgente repensar a forma como se concilia desenvolvimento com preservação. Construir é necessário mas não pode significar apagar a memória colectiva. Se Elvas perder estes vestígios, perderá mais do que casas, perderá a sua alma histórica.
(Foto DR)
Paulo Freitas do Amaral
Professor, Historiador e Autor