Viseu as Contas Municipais 2010/2019 (Parte 1: A Insustentabilidade de trajetória)

Adicionalmente se realizarmos uma média dos impostos diretos pagos por cada Viseense (ponderação por habitante) ao longo destes 10 anos, verificamos que esse valor tem consistentemente vindo a crescer, passando de 162€, no ano 2010, para os 259€, no ano 2019, o que traduz um agravamento mais de 60% da carga fiscal municipal.

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  • 20:02 | Domingo, 06 de Dezembro de 2020
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Ponto Prévio

O exercício que vos proponho fazer é simples. Analisar com algum detalhe, focando no essencial (sem ser maçador) as Contas do Município de Viseu ao longo dos últimos 10 anos, compreendidos entre 2010 e 2019. Neste período engloba-se o último mandato de Fernando Ruas (2010/2013), o primeiro de Almeida Henriques (2014/2017) e metade do segundo mandato, também de Almeida Henriques, nos últimos dois anos (2018/2019).As fontes de dados que utilizarei são apenas oficiais e resultam quer dos Relatórios & Contas Anuais aprovados pelo Município de Viseu, quer das Contas Consolidadas aprovadas pela Assembleia Municipal quer ainda os Relatórios Anuais dos Municípios Portugueses, publicados pela Ordem dos Contabilistas Certificados.

 


Primeiro

Ao longo da última década a Receita média anual cobrada pelo Município de Viseu situou-se nos 51,3 milhões de euros, enquanto que, para o mesmo período a Despesa se ficou pelos 50,2 milhões de euros. Importa notar, contudo, que esta folga média anual, de pouco mais de 1 milhão de euros, tem vindo a reduzir-se de forma considerável ao longo dos anos, tendo desaparecido por completo nos últimos 3 anos analisados, respetivamente 2017, 2018 e 2019.

Assim, a partir de finais do ano 2016, o valor médio das Receitas anuais situou-se nos 52,6 milhões de euros, enquanto que, a Despesa se fixou nos 56,3 milhões de euros, isto é, a Despesa média anual, nos últimos 3 anos da série superou a Receita, em média e em cada um dos anos, mais de 3,7 milhões.

Esta mudança de paradigma, não permite gerar poupança, desequilibra o orçamento – colocando em causa o princípio do equilíbrio orçamental com o desajustamento entre a Receita e a Despesa correntes – e cria um problema, a prazo, de sustentabilidade das Contas do Município.

 

Segundo

Se analisarmos com um pouco mais de detalhe, a Receita cobrada pelo Município ao longo destes 10 anos, nomeadamente no que toca a Impostos Diretos pagos pelos Viseenses (IMI, IMT, DERRAMA, IUC), verificamos que a Autarquia arrecadou para os cofres municipais cerca de 200 milhões de euros. Deste valor global, quase 60% correspondeu a IMI, cerca de 18% a IMT e os restantes 22% a Derrama e IUC (repartindo cada um deles cerca de metade deste valor).

Se fizermos uma comparação entre o valor arrecadado pelo Município de Viseu, em cada um destes impostos, no inicio da série (ano 2010) com o momento mais recente (ano 2019), verificamos que, o crescimento das Receitas de IMI se situou nos 52,7%, do IMT de 78,1%, da Derrama de 27% e do IUC de 70,2%.

Adicionalmente se realizarmos uma média dos impostos diretos pagos por cada Viseense (ponderação por habitante) ao longo destes 10 anos, verificamos que esse valor tem consistentemente vindo a crescer, passando de 162€, no ano 2010, para os 259€, no ano 2019, o que traduz um agravamento mais de 60% da carga fiscal municipal.

Esta ponderação, por número de habitantes, tem obviamente alguma fragilidade de análise, uma vez que há um conjunto alargado de habitantes que não paga imposto, ainda assim se cruzarmos este valor com um outro facto (estatisticamente relevante) e que é o da perda populacional no Concelho de Viseu, associada ao forte envelhecimento da população residente, facilmente se perceberá a criação de um outro problema de sustentabilidade: há menos pessoas a viver em Viseu, muito mais envelhecidas e a pagarem mais impostos.

 

Terceiro

Se agora analisarmos a Despesa, com maior detalhe, verificamos que em média e ao longo destes 10 anos, a “aquisição de bens e serviços correntes” (externalização de serviços), representou anualmente cerca de 14,1 milhões de euros. Se repartirmos esta série, por mandatos (conforme Fonte de Dados) verificamos que entre 2010/2013 (último mandato de Fernando Ruas), esta Despesa era em média de apenas 11,1 milhões de euros anuais. No período seguinte (primeiro mandato de Almeida Henriques) cresce cerca de 29% passando para uma média anual de 14,3 milhões de euros e nestes dois últimos anos da série 2018/2019 (metade do segundo mandato de Almeida Henriques), esse valor disparou para os 19,9 milhões de euros, isto é, um crescimento de mais de 79%. Em média e anualmente o Município gasta hoje, nesta rúbrica, mais de 8,8 milhões de euros do que o que gastava no ano 2010.

Assim, o peso relativo desta rúbrica de Despesa, no valor total da Despesa, era no início desta série (ano 2010) de cerca de 17,6% enquanto que no final do ano 2019 (final da série) se situava praticamente nos 33%. Isto significa que no ano 2010 o Município de Viseu gastava apenas 1€ em cada 6€ com despesas correntes (externalizáveis). Passados 10 anos, já em 2019, este valor praticamente duplica, isto é, 1€ em cada 3€ são gastos na externalização de bens e serviços.

Este dado estatístico não deixa de ser também algo paradoxal, uma vez que nos últimos anos, o Município de Viseu tem aumentado significativamente o número e o valor da Despesa com Recursos Humanos. Este facto, deveria ser um argumento importante para reverter, pelo menos em parte, o valor de Despesa que o Município de Viseu tem com a externalização de serviços, o que de facto não tem acontecido.

Importa, finalmente, sublinhar que em 10 anos a Despesa Global da Autarquia de Viseu cresceu 87%, enquanto que, no mesmo período, a Receita Fiscal – principal componente da Receita Global que decorre da cobrança de impostos diretos pagos pelos Viseenses – apenas cresceu 48,7%. Esta diferença de ritmos de crescimento está também a criar um problema de sustentabilidade das Contas Municipais, uma vez que se tornará impossível de manter, por muito mais tempo tal trajetória, a não ser aumentando fortemente o nível do endividamento ou cortando de forma abrupta parte dos compromissos de Despesa assumidos ou a assumir.

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