Há um país inteiro escondido sob o pó das estradas e o silêncio dos montes — e esse país chama-se Portugal. Um território onde o passado ainda respira, mas que o presente insiste em ignorar. Em pleno século XXI, continuamos a viver de costas voltadas para o nosso património mais antigo: aquele que foi erguido à força de braços, antes de haver templos, reis ou palavras.
E não é apenas o Sul que guarda tesouros. No Norte, as citânias castrejas, como Briteiros, Sanfins ou Sabroso, revelam uma civilização organizada, muralhada e sofisticada, anterior à chegada de Roma. A elas devemos parte da nossa matriz cultural — mas continuam arredadas dos grandes circuitos turísticos, tratadas como curiosidades regionais.
Portugal tem tudo para ser o destino megalítico mais rico e diverso do continente: dólmens, menires, cromeleques e povoados fortificados que contam, pedra a pedra, a história das nossas origens. O que não tem é uma estratégia nacional. Em vez de um Roteiro das Origens, que una o Alentejo das antas ao Minho das citânias, continuamos mergulhados numa política de capelinhas, onde cada câmara municipal promove “o seu” monumento, “a sua” rota, “o seu” folheto turístico, como se o passado pudesse ser repartido por freguesias.
Temos mais de 800 antas, 254 menires, dezenas de cromeleques e citânias que desafiam o tempo.
Temos tudo — menos visão.
E enquanto essa faltar, continuaremos a ser o país que esquece as suas pedras.
(Foto Anta da Comenda da Igreja . DR)
Paulo Freitas do Amaral
Professor, Historiador e Autor