Lobo Xavier, o alicate de Marcelo

Xavier é o alicate de Marcelo. Abusando do estatuto senatorial, indo além da aura que o obrigaria a distância, transformou-se no mecânico de Belém, atarraxando a maledicência, fornecendo revisões do que se terá passado no Conselho de Estado e polimentos do que lhe disseram das reuniões entre PR e PM e entre PR e PGR.

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  • 12:35 | Segunda-feira, 27 de Novembro de 2023
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Não podemos ignorar que existe um problema na comunicação entre o Presidente da República e o Primeiro Ministro. Esse problema não é de hoje, foi crescendo a partir da saída de Rui Rio da liderança do PSD.

Marcelo encontrou no Governo das esquerdas um aliado para se consagrar como o presidente da proximidade e dos afetos. Todo o seu primeiro mandato foi centrado numa linha política que visava a estabilidade, que criava as condições para que a Geringonça, a partir do lado mais afastado do seu pensamento, lhe ampliasse a aprovação popular, rumo à reeleição.

Vencida essa etapa, derrotado Rui Rio, afastado de vez Pedro Passos Coelho, o Presidente da República iniciou um ardiloso processo de limitação do Governo. Foram os vetos a leis relevantes por mera embirração, foram as interferências nítidas nas competências do Executivo e do Parlamento, foram mesmo implicações na Justiça que só existiram porque se sustentavam na comoção popular.

A solidão do Presidente da República leva-o a sair a horas pouco usuais, a implicar com a vida dos mais próximos, a não deixar um noticiário sem quatro comentários sobre tudo e sobre nada. Assim banalizou a palavra, assim transformou o posto em coisa comum.


A incisão na relação oficial e pessoal entre Marcelo e Costa consagrou-se na crise havida com a manutenção do Ministro das Infraestruturas, João Galamba, em funções. Marcelo não só foi atrevido na interpretação dos poderes que a Constituição da República lhe confere, como não mais deixou de ampliar a ideia de uma possível dissolução da Assembleia da República.

E foi dessa dissolução que nasceu o primeiro grande embate acerca do que se tem passado no Conselho de Estado.

Marcelo deixou o Executivo a levedar entre duas reuniões deste órgão, permitiu que personalidades que o integram, e são comentadores políticos, tivessem trazido o que lá se passou para a praça pública sem qualquer possibilidade de contraponto.

Muitos portugueses terão desgostado do comportamento de Marques Mendes e Lobo Xavier nesses dias de turbulência que levaram Costa a não querer intervir no final da tal segunda reunião. E eu não gostei que se tivesse passado, para a opinião pública, uma narrativa cheia de falhas, plena de recados.

O Conselho de Estado deveria ser um espaço respeitável, mas o Presidente da República e alguns dos membros por si escolhidos transformaram-no numa desnecessidade da República.

As questões que se prendem com a crise política que vivemos, são ainda mais graves. Conheço Costa há quatro décadas e não adivinharia que fosse tão ingénuo. Estava na cara que Marcelo se ia vingar como sempre aconteceu com todos os que lhe passaram pela frente, estava claro que ia utilizar todos os veículos para passar mensagens cruzadas que impusessem a Costa chagas maiores do que o processo em que é alvo.

A sua caminhada até ao pelourinho situado no terreiro onde foram assassinados os Távora, somando à explicação do que ali tinha acontecido a palavra “traição”, demonstra o quão perverso é o inquilino de Belém.

Mas foi o facto de se ter transformado no decisor único de qualquer solução sobre o futuro que ainda criou mais confusão política, aumentou a valorização dos extremos. Os professores Marcelo e Ventura são, nos dias de hoje, os maiores aliados, populismo somado a populismo, perversão somada a maquiavelismo. E somaram António Lobo Xavier…

Lobo Xavier já se tinha dado a ponta de lança do Presidente em tempos passados. Mas agora foi eleito como delfim no circo montado.

Xavier não se limita no dizer o que se passou e não passou, no que ouviu e não ouviu, tudo porque sabe que ninguém, com dois dedos de testa, vem a terreiro para com ele contender. Xavier também sabe, e esse é o lado mais desrespeitoso, que em Portugal há muito quem bata quando se está na mó de baixo.

Xavier é o alicate de Marcelo. Abusando do estatuto senatorial, indo além da aura que o obrigaria a distância, transformou-se no mecânico de Belém, atarraxando a maledicência, fornecendo revisões do que se terá passado no Conselho de Estado e polimentos do que lhe disseram das reuniões entre PR e PM e entre PR e PGR.

Infelizmente para a nossa democracia, atingimos o nível mais baixo no exercício das funções públicas.

 

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Publicado em Opinião