As Europeias, o PS e o PSD

Eu sei bem que para Costa seria engolir um sapo, mas o PS poderia ganhar as eleições se António José Seguro regressasse.  

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  • 22:07 | Quinta-feira, 09 de Fevereiro de 2023
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A dependência de uma legislatura, com maioria absoluta de um só partido, relativamente a umas eleições de natureza local ou europeia, não deveria colocar-se. Mas colocou-se no debate das últimas semanas, sem que o PS tivesse antecipado essa narrativa e encontrado, para ela, o antídoto certo.

Não basta dizer que já houve outras maiorias absolutas que não ficaram em risco perante eleições nacionais não legislativas, até porque já tivemos situações para todos os gostos. Eleições locais que, dois anos depois, deram uma nova maioria absoluta ao PSD – as autárquicas de 1989 quando o PS ganhou Lisboa e o Porto; eleições que não provocaram o fim do governo de maioria do PSD, mas levaram a uma degradação muito significativa da sua ação – as europeias de 1994; eleições que levaram o Primeiro Ministro do PS a demitir-se e a provocar eleições – as autárquicas de 2001; e, ainda, eleições que fizeram com que o chefe do Governo do PSD/CDS desse de frosques e seguisse para Bruxelas – as europeias de 2004.  Cada eleição é diferente das anteriores, as circunstâncias determinam irremediavelmente o futuro, sem que as alusões ao passado muito possam dizer.

Está bom de ver: as eleições europeias vão mesmo determinar a saúde do Governo, a possibilidade de chegar a fim da legislatura. Já estava marcada a linha de rumo quando o Presidente da República, no dia um do Executivo, determinou o seu fim se António Costa rumasse a um outro cargo.


As eleições para o Parlamento Europeu são mesmo muito importantes para o PS. São, porque os socialistas portugueses, se quiserem ter condições para negociar um lugar relevante no contexto da distribuição dos cargos de topo, vão precisar de continuar a ser uma voz substantiva no grupo dos socialistas e democratas europeus; são porque se Costa não for para a Europa, vai ter de ser candidato presidencial, cargo para o qual está preparado e que ele quer, mesmo não querendo; são, porque o PS não pode fazer uma segunda parte do mandato tão sofrida como foi o último ano político (que não económico) colocando em risco a meta dos 30% a que o eleitorado socialista parece corresponder.

E como deve o PS preparar-se para essas eleições? A primeira regra é a abertura do seu espaço eleitoral atual. Eu sei bem que para Costa seria engolir um sapo, mas o PS poderia ganhar as eleições se António José Seguro regressasse. Foi líder do PS, ministro, deputado europeu e é professor na área das relações internacionais. Não está marcado pelo desgaste do Governo e ninguém põe em dúvida a sua capacidade de mobilização e o seu profissionalismo na construção de movimentos eleitorais.

Mas Costa poderá escolher entre outros dois socialistas, talvez mais sustentados sob o ponto de vista ideológico, parecidos em termos de posicionamento político, descuidados, ambos, das coisas das campanhas e das agendas, mas com eleitorados próprios que não são só os que hoje alinham na base do PS dos 27 a 30%. Francisco Assis e Sérgio Sousa Pinto são dois dirigentes que falam para o país sem limitações. Não sei se Costa se sentiria bem com um convite a algum deles.

De entre todos os que estão hoje na ribalta há muitos nomes que poderiam liderar a lista. Pedro Silva Pereira é um quadro relevantíssimo, mas o partido deve poupá-lo a esse esforço. Fernando Medina, apesar do desgaste, não deixará de ser a opção para Comissário Europeu, se Costa não for Presidente do Conselho e, no fim que pode ser o princípio, Ana Catarina Mendes, acabando por ser a escolha, uma boa escolha, mas que não será novidade e poderá não alargar aos públicos descontentes.

O PS joga muito, mas o PSD joga mais.

Nos últimos dias alguém lançou a lebre de Rui Moreira para ser o primeiro dos candidatos. É mesmo uma impossibilidade. Porque ninguém escolhe um candidato a esta distância, o efeito surpresa esfumava-se, e quando fosse para a campanha já tinha morrido. Não direi que Moreira não possa ser um dos membros da lista de candidatos, um número dois ou três, até porque o PSD quererá fazer um acordo para que Rangel deixe Bruxelas a caminho de uma candidatura à Câmara Municipal do Porto em que só não ganhará se o PS candidatar Luísa Salgueiro numa equipa com Barbosa Ribeiro.

Nestas Eleições Europeias também se verá o nervo de Montenegro. Se fosse um líder de mão cheia assumia ele próprio o encargo. Ao candidatar-se ao PE, como primeira volta de uma disputa para as legislativas seguintes, ganhando, receberia uma legitimidade única, poderia ser uma carpete vermelha para a governação. Mas não o antecipo nesse arriscar!

 

Outra aposta do PSD, que seria digna de um grande partido, revelar-se-ia na candidatura de Pedro Passos Coelho. O “bicho papão” está a cada dia mais longe, o país vai, lentamente, colocando o ex-Primeiro Ministro num outro patamar. Passos Coelho poderia ser o António Costa do Partido Popular Europeu, ser ele próprio uma solução para Presidente do Parlamento Europeu, na primeira parte do mandato, como caminho para uma candidatura presidencial.

E há, ainda, a possibilidade, mesmo que remota, de o PSD fazer o que o PS também fez – escolher Cavaco Silva para esta última tarefa. Mário Soares ganhou, Cavaco dificilmente ganharia.

Tudo isto para dizer que as Europeias não são um mero ponto na agenda política e determinarão, profundamente, os tempos próximos. O futuro do Governo, o futuro dos principais protagonistas, o futuro dos partidos. E há sempre um alerta que importa ter presente – sendo ainda possível que o CDS e o PAN, por ser um só círculo nacional, elejam um deputado; sendo praticamente garantido que o PCP e o BE elegerão um deputado e que a IL e o Chega elegerão dois ou três, os lugares que restam serão muito menos. O PS pode perder dois ou três e o PSD pode não aumentar nenhum. Contas que também relevam para a dimensão de uma vitória ou uma derrota na noite de apuramento dos votos.

Quem analisa a política portuguesa poderá antever que os próximos meses serão determinantes para o Governo e para o PS, mas também para a antecipação de uma alternativa e o papel que o PSD poderá nela ocupar.

 

Ascenso Simões

 

(Foto DR)

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Publicado em Opinião