Ardemos de novo!

O Luís esteve no Pontal, na sua festa partidária, e desculpem-me, mas custou ver. Custou ver que o Luís tinha preparada uma panóplia de anúncios de investimentos e não teve a coragem de voltar para trás, de olhar para a metade do país que ardia

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  • 13:00 | Sábado, 30 de Agosto de 2025
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A nossa região ardeu de novo. Sim, o que tinha ardido em 2017 nos concelhos de Arganil e Oliveira do Hospital voltou a arder.

Muitos avisaram que isto voltaria a acontecer, principalmente, vários autarcas. E foi triste ver o Primeiro-ministro a discursar na sua festa partidária e apontar 3 únicas falhas: condições climatéricas, negligência no uso do fogo e criminalidade. Todos sabemos que não se trata só disto.

O Luís diz estar solidário, eu também, estamos todos. Mas que será que basta com isto?


Portugal demorou muito a acionar o mecanismo europeu de ajuda (Espanha já o tinha feito) enquanto o país ardia há semanas: em Ponte de Barca, Arouca, Penamacor, Covilhã, Oliveira do Hospital, Mangualde, Arganil, Fundão, Trancoso, Mirandela, Penalva do Castelo, Sernancelhe, Moimenta da Beira, etc. O que foi preciso arder mais e durante quanto tempo para que “tecnicamente” fosse necessário pedir ajuda? Que tenham falecido pessoas?

Durante o período crítico dever-se-ia ter reforçado o pedido de ajuda a Marrocos (que deve ser dos países mediterrânicos mais calmos relativamente aos incêndios, por enquanto), já deveríamos ter batido à porta dos nossos países amigos da Europa, de fora da Europa, porque estávamos a meio de agosto, falta ainda setembro e falta ainda outubro. Precisamos de ajuda nestas alturas, é a própria Ministra da Administração Interna a dizer que não há meios suficientes, então, estávamos à espera do que? Que o calor acalmasse?

Faltou coordenação, menos centralismo nos Teatros de Operações. Deixar mandar a quem conhece o terreno, deixar coordenar a quem está junto das populações todos os dias. Ouvimos Presidentes de Câmara e bombeiros a dizer que foi tudo uma falta de organização terrível, mas afinal não aprendemos nada?

Falta pensar no problema durante o ano todo. O Estado tem que investir na floresta e deixarmos este processo de tentativa de legitimação em que a indústria será a salvadora da pátria porque a floresta deles não arde, não há tempo para isso, não há tempo para passar por esse processo. O Estado precisa de meter pessoas na floresta durante o ano todo, precisa de limpar e cuidar durante o inverno e precisamos de um grande aparato de vigilância nas nossas florestas, sim, precisamos de vigiar a floresta de maio a outubro. Precisamos de vigilantes durante os meses quentes, de mais postos de vigia, de equipas de sapadores por todo o país, a floresta precisa de investimento do Estado de forma urgente.

Precisamos de desfocar das teorias da conspiração, dos territórios que ardem por causa das minas (que já em 2017 circulou também essa teoria), que são por causa dos painéis fotovoltaicos, pelas eólicas. Ainda há uns dias andou a circular uma teoria da conspiração por causa de um projeto fotovoltaico nos concelhos de Arganil e Tábua, projeto esse que fica a quilómetros do Piodão. Estes senhores têm o poder de adivinhar para onde vai o fogo? Um projeto que começou a ser planeado em 2023. Atenção, não quero defender estes projetos megalómanos, seja de minério, seja fotovoltaicos ou de eólicas (tenho sérias dúvidas se as dimensões destas instalações são adequadas, tenho dúvidas até dos locais onde são feitas, mas acredito mesmo que desfocamos do essencial). 

O Governo apresentou propostas para resolver às necessidades das populações afetadas, mas pouco apresenta para o futuro da floresta. Planos para 25 anos? Vamos arder mais 3 ou 4 vezes. O maior partido da oposição, o Chega, para além da sua mononarrativa penalista, agora quer que não se trabalhe e que não sejam feitos negócios nesses terrenos ardidos durante 10 anos, convido o Chega e o André Ventura a visitar terrenos em Santa Comba Dão, Carregal, Tábua, terrenos que arderam, que ficam ao abandono e hoje são um autêntico barril de pólvora com a regeneração natural do eucalipto. Ora, teorias da conspiração, negócio escuros, cá vem o Chega dar resposta enquanto a verdadeira reforma fica por fazer.

O Luís esteve no Pontal, na sua festa partidária, e desculpem-me, mas custou ver. Custou ver que o Luís tinha preparada uma panóplia de anúncios de investimentos e não teve a coragem de voltar para trás, de olhar para a metade do país que ardia.

Ardeu também o país vizinho, o território espanhol teve vários fogos importantes de grande dimensão. Ardeu a Galiza, ardeu a zona raiana com Portugal, ardeu uma aldeia no município de Monterrei, A Caridade, bem pertinho da fronteira.

Ouvimos e vemos todos os dias as pessoas afetadas, a voz da impotência, do medo, de uma vida destruída. Sofrem as pessoas, sofrem os bens, a flora evapora-se e a fauna desaparece.

Falta ação, muita.

 

Foto Manuel Malva

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Publicado em Opinião