C.P. – Comboios Pré-históricos

A CP está podre. Não por culpa dos trabalhadores, que muitas vezes fazem milagres com meios miseráveis. Mas porque foi capturada por sindicatos que vivem em permanente chantagem. Travam tudo o que cheire a modernização. Bloqueiam a digitalização, combatem a responsabilização, ameaçam com greves sempre que alguém ousa querer mudar qualquer coisa. E os sucessivos governos ajoelham.

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  • 12:39 | Terça-feira, 08 de Julho de 2025
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Viajar na CP em 2025 é como recuar no tempo — e não estou a falar de nostalgia. Falo de degradação real, concreta, sistemática. Uma empresa pública que se arrasta como se vivesse num Portugal sem futuro. Apanho o comboio em Vendas Novas, onde já não há estação — há ruínas. Não há um funcionário, não há uma máquina, não há rede, não há informação. Há, no entanto, um comboio. Um ferro velho sobre carris, sem internet, sem dignidade, e sem vergonha.

E depois aparecem os revisores. Não para ajudar — para caçar. Fiscalizam com o zelo de um comissário soviético. Perguntam em que estação se entrou, se sabia que naquela não se paga, se naquela se pode pagar, se naquela é multável. Como se os passageiros tivessem de decorar o labirinto kafkiano de regras não escritas que só os iluminados da CP conhecem. Bilhete? Só em dinheiro. Cartão? Não aceitamos. Apareceu com o telemóvel sem bateria e sem multibanco por perto? Problema seu. Multa.

Mas o caos não fica por aqui. Precisa de um passe para Lisboa? Boa sorte. Em toda a linha do Sul, só o Pinhal Novo o vende. Nem o Pragal, em Almada, uma estação urbana movimentada, vende passes CP. E se for a primeira vez que o tira? Espere sentado. Um mês de espera, porque o sistema é analógico, burocrático e hostil. Como se cada passageiro tivesse de provar que merece entrar no comboio. E antes da farsa dos passes baratos do Governo, a coisa era ainda mais ridícula: o passe custava 300 euros — e só com parecer camarário (!) se conseguia um desconto de 100 euros. Um parecer para andar de comboio. Isto não é serviço público — é serviço punitivo.

Enquanto isso, do outro lado do espelho, a Fertagus. Privada. Moderna. Eficiente. Com torniquetes, pontualidade, máquinas a funcionar, canais de apoio, controlo digital, previsibilidade. Um milagre? Não. Apenas uma empresa normal. Uma empresa que respeita quem viaja e que existe para servir, não para castigar.


A CP está podre. Não por culpa dos trabalhadores, que muitas vezes fazem milagres com meios miseráveis. Mas porque foi capturada por sindicatos que vivem em permanente chantagem. Travam tudo o que cheire a modernização. Bloqueiam a digitalização, combatem a responsabilização, ameaçam com greves sempre que alguém ousa querer mudar qualquer coisa. E os sucessivos governos ajoelham.

E depois perguntam por que razão os portugueses não usam o comboio. Porque é um pesadelo. Porque é um atentado ao tempo, ao bolso e à paciência. Porque a CP, em vez de ser a espinha dorsal da mobilidade verde, é a caricatura de um Estado que perdeu a capacidade de funcionar.

A única saída é clara: privatização total. Chega de subsidiar o absurdo. Chega de alimentar uma estrutura que despreza os utentes e se escuda em discursos sobre “serviço público” para continuar tudo na mesma. O verdadeiro serviço público é pôr os comboios a andar, em vez de andarmos todos a pé — ou de multa na mão.

Portugal não pode continuar a ser o único país da Europa onde o futuro chega com uma hora de atraso… todos os dias.

 

Paulo Freitas do Amaral
Professor, Historiador e Autor

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