Silêncio

  Iam todas as manhãs ao café de mãos dadas. Ele vestia fato, ela vestia um casaco verde esmeralda amachucado, pousado na cadeira. Tinham destinos diferentes, mas davam as mãos e o olhar.  De manhã, cheirava a sabonete azul até à minha varanda. O café era na esquina, não era longe, o passo não era […]

  • 12:36 | Sábado, 02 de Junho de 2018
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Iam todas as manhãs ao café de mãos dadas. Ele vestia fato, ela vestia um casaco verde esmeralda amachucado, pousado na cadeira.

Tinham destinos diferentes, mas davam as mãos e o olhar.  De manhã, cheirava a sabonete azul até à minha varanda.


O café era na esquina, não era longe, o passo não era acelerado, nada acelerado.

Deixavam-se ir, às vezes largavam as mãos e ela abraçava-o pela cintura.  Muitas vezes paravam no caminho e vingavam um beijo e metros depois chegavam ao café. Ele puxava-lhe a cadeira, sentavam-se, sorriam e iam buscar os cafés. Não havia um único dia que fossem sozinhos, ou quando havia eram poucos, por compromissos diferentes, mas no dia a seguir tudo se confirmava e reafirmava.

Houve um dia que vieram mais afastados, ainda que lado a lado, as mãos não se uniram, o impulso do beijo não fez parte do caminho, e houve dias em que até as sombras se afastaram.

Houve um dia que aceleraram os passos, com as mãos nos bolsos. Já não sorriam, os dedos não se entrelaçaram, como segurando algo que se possa perder, não o compasso, não o abraço, ou a cintura.

Fazia frio e o Inverno estava a chegar, um dia não cheirou mais a sabonete azul, não mais dobraram a esquina. Teriam mudado de café, de morada ou de mãos.

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