Os 8, num 8

Gostava de saber, de todos, quem é que se dispõe a taxar como deve ser os lucros fabulosos da banca, das gasolineiras, das distribuidoras, aligeirando o garrote sobre as famílias. Gostava de saber onde vai buscar o dinheiro, quem tudo promete. Gostava de saber, de todos, porque é que os acordos de regime são tão difíceis de alcançar. Gostava de saber, de todos, porque é que com tantos diagnósticos, tardam as soluções. Gostava de saber, de todos, porque é que, com tantos milhões, continua a pobreza e a exclusão social. Gostava de saber como vai ser possível acontecer o que até há pouco era proibido fazer-se.

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  • 17:19 | Segunda-feira, 26 de Fevereiro de 2024
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Quando eram 4, o episódio acontecia à volta de uma meia-lua curta, transmitido a preto e branco, com menos tecnologia, e corria bem. Aprendia-se com todos, da esquerda à direita, até porque há gente boa e séria em todo o lado. Cada um tinha tempo para dizer de sua justiça, suava as estopinhas, e deixava a pele no estúdio. Com 8, não é fácil, são muitos personagens, e o tempo não chega. A verdade, porém, é que se fossem mais minutos, também cansava. É uma equação difícil de resolver. No final, fica a sensação de que este modelo não traz vantagem a ninguém.

Por mim, julgo que os debates a dois, com mais minutos, e não apenas 15 para cada lado, são um modelo mais próximo, mais esclarecedor, os debatentes não podem esconder as expressões que, por vezes, revelam muito mais do que as intenções, são traídos por detalhes. Preferível, portanto.

No debate de 6.ª feira, os temas abordados, os arranjos que estavam dispostos a fazer e/ou a aceitar, no pós-eleições, que esgotaram a 1.ª parte, a justiça, a saúde e a fiscalidade foram temas claramente insuficientes para uma clarificação das propostas gerais de cada um.

De fora, ficaram as finanças (compromissos com o défice e a dívida pública), a habitação (o caos, num direito natural), a economia (competitividade, inovação, qualificação), a pobreza, a corrupção (sem fulanização, que só afunila a discussão), a sustentabilidade da Segurança Social, a política de rendimentos (com a subida justa do salário mínimo, o que acontece ao salário médio?), a educação, a cultura, o ambiente, a defesa, os conflitos internacionais, o papel da União Europeia (incapaz de gerar consensos em questões tão básicas, quanto as humanitárias, e forte a juntar agricultores nos protestos).


Sobre estes candentes temas, nem uma voz se manifestou, mesmo podendo qualquer um atirá-la para a mesa, em jeito de provocação. Se o debate tivesse ido por aí, melhor se distinguiriam os autênticos dos comediantes.

Gostava de saber, de todos, quem é que se dispõe a taxar como deve ser os lucros fabulosos da banca, das gasolineiras, das distribuidoras, aligeirando o garrote sobre as famílias. Gostava de saber onde vai buscar o dinheiro, quem tudo promete. Gostava de saber, de todos, porque é que os acordos de regime são tão difíceis de alcançar. Gostava de saber, de todos, porque é que com tantos diagnósticos, tardam as soluções. Gostava de saber, de todos, porque é que, com tantos milhões, continua a pobreza e a exclusão social. Gostava de saber como vai ser possível acontecer o que até há pouco era proibido fazer-se.

Talvez numa próxima oportunidade, mais cedo do que se possa imaginar, venha a saber. Pelo que vi, e vi tudo, não acredito que os indecisos tenham deixado de o ser, ficando, porventura, ainda mais confusos. No mais, os líderes foram cinzentões, muito artificiais, disciplinados em excesso, muito amarrados ao guião, contidos nas baias que lhes dão segurança e conforto, um ou outro mais rebuscado, mais consistente, mais convincente.

Carlos Daniel, o pivot, ajudou, exagerando no controlo dos tempos, condescendente, porém, aqui e ali, com os suspeitos do costume, PS e PSD. Foi fraquinho, muito disciplinador, preocupado com os ponteiros do relógio, e nada ousado, fugindo a espicaçar os que, com tantas promessas, tinham a obrigação de dizer ao que vinham. Não criou dinâmicas, foi mole e pouco criativo.

No joguinho cínico, e com sorriso cândido, Montenegro manteve o tabu. Depois do “não é não”, e com as últimas sondagens a saberem-lhe bem, aceita-se o biombo onde se resguarda, mas percebe-se mal a confusão que deixa medrar.

Nuno Santos surpreendeu, ao admitir viabilizar um governo da AD, se o PS não vencer e a esquerda não tiver a maioria. Precisamente a ideia que, na disputa interna, tanto condenou em José Luís Carneiro, zurzindo nela, como se fosse coisa do demónio. Já não é a primeira vez que PNS diz e se contradiz. E isso não o ajuda, deixa a perigosa sensação de andar ao sabor do que, em determinado momento, lhe convém.

De permeio, pareceu-me que a maioria dos presentes jogou à defesa, evitando, com sucesso, dizer o que queria esconder. Ou por não terem ideias, ou por elas não serem, eleitoralmente, vantajosas, ficaram em silêncio sobre temas quentes. Nesses aspecto, o debate correu-lhes a contento. Foram habilidosos. Ninguém perdeu, ganharam todos. Até as interrupções, as provocações civilizadas, o contraditório, os despiques, as partes gagas estiveram ausentes e fizeram falta ao festim, que se supunha viesse a ser didáctico.

Não gostei da tertúlia, não teve garra, faltou-lhe vitamina. Foram todos lenientes. Nenhum político teve um rasgo, uma ideia galvanizadora que virasse o tabuleiro, que mudasse o jogo, que fizesse acreditar numa nova esperança.

Acredito que os debates poderão desequilibrar a balança, mas só quando são intensos, espectaculares, com líderes carismáticos, bons tribunos, e jornalistas assertivos, bem preparados. A evidente falta de uns e de outros paga-se caro.

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