O tempo da razão

E, se não seguirem o que os resultados ditaram, está mal, muito mal. Será um desrespeito pela vontade popular. Quem não gostar, tem uma solução, prenhe de arduidades: mudar o povo.

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  • 12:31 | Segunda-feira, 26 de Maio de 2025
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Politicamente, talvez tenha chegado a hora de dividir os portugueses em duas categorias: os democratas e os não democratas. Sabendo que no campo da direita há muitos genuinamente democratas e na área da esquerda também há outros que o não são.

É oportuno e avisado subalternizar, por agora, a divisão entre esquerda e direita, que só traria querelas para a discussão, com o passado a ensombrar soluções.

Procurar mais o que une do que aquilo que separa. Ao contrário do que muito boa gente pensa e escreve, certamente na pressa de sarar as feridas, esta realidade nunca se colocou antes, nem nos piores resultados do PS: em 1985, com Almeida Santos – 20.8% e 1.200.000 votos – e em 1987, com Vítor Constâncio – 22.24% e 1.260.000 votos.


O que, desta feita, aconteceu foi uma calamidade, um desastre. Nunca antes, o PS deixou de formar governo ou de ser o principal partido da oposição. Agora, se o PSD for imprudente, ou se deixar deslumbrar, o PS poderá tornar-se irrelevante no xadrez político.

Era expectável uma derrota, mas não que ela fosse tão pesada. O PS corre o risco de não ter representante no Conselho de Estado, ser indiferente na nomeação do Provedor de Justiça e dos juízes do Tribunal Constitucional.

Na primeira linha, estará André Ventura. Ele vai ser o líder da oposição. Não há volta a dar, é factual. Habituemo-nos, na esperança de que seja uma estrela-cadente, fenómeno passageiro. Atiçá-lo, virar-se-á contra os fazendeiros da esquerda. Será com ele que primeiro falarão o PR e o PM, o grande vencedor das eleições, já que o PS centrou na sua pessoa o fundamental da campanha – o foco na sua idoneidade foi um erro tremendo, um tiro no pé absolutamente infantil – em detrimento de programas e projectos para Portugal.

E, se não seguirem o que os resultados ditaram, está mal, muito mal. Será um desrespeito pela vontade popular. Quem não gostar, tem uma solução, prenhe de arduidades: mudar o povo.

Tudo isto é duro? É! 2/3 dos deputados sentam-se à direita do hemiciclo. Nunca tal acontecera. Sucede que o número – AD+CHEGA+IL – é suficiente para uma revisão constitucional. Então, sejamos correctos na análise: este cenário não é a repetição de algo que já acontecera antes. Evitar este entendimento, é adiar a correcção dos erros acumulados, e não é bom augúrio. É certo que a conjugação da AD+PS+Livre ou da  AD+PS+IL, configura cenários, que constituirão uma alternativa, também suficiente.

Dito isto, o PSD tem nas suas mãos o futuro do regime. Sem ele, nada se fará. Com ele, tudo será possível. Será a sua vez de dar a mão ao PS, em nome da sobrevivência da democracia.

Nestas circunstâncias, cabe aos socialistas sentido de humildade e de responsabilidade. Não inviabilizar a governação da AD, e preparar- se para uma cura de oposição. De uma legislatura, ou mais. Repensar políticas e novos políticos. Fazer o caminho das pedras, por vezes, compensa e traz ganhos no futuro.

Se obstaculizar a acção do governo, outras eleições virão em breve, e o CHEGA disputará o 1.⁰ lugar. Se não houver juízo, está escrito nas estrelas.

Algumas cabeças “pensantes” do Largo do Rato parece que já acordaram para a realidade, escolhendo um líder moderado, um homem ponderado, com sentido de Estado, que recentrará o partido, com ganhos a prazo. Cabe ao PS saber escolher o que é principal, neste momento. E não empurrar o PSD para o colo de André Ventura. José Luís Carneiro saberá fazê-lo, assim as cobras e os lagartos do aparelho – velhas lapas, firmadas nas rochas, fantasmas das cavernas – o deixem trabalhar. Ironia das ironias, o combate à extrema-direita será liderado pela direita clássica, democrática, constitucional. Se esta se sair bem da contenda, a democracia agradecer-lhe-á a decência.

Nos últimos 30 anos, desde 1995, o PS governou ¾ do tempo. Responsabilidades no estado actual da arte, são com ele. Não vale a pena lavar as mãos e dissociar-se da anterior falta de empenho em soluções de compromisso para reformas concretas e estruturantes, que contribuiriam para a estabilidade política e a modernização do país. Com duas maiorias absolutas e um acordo para 4 anos, o que fez foi mesmo poucochinho. Faltou-lhe ímpeto reformista. Nomeadamente, o endeusado Costa, hábil nos equilíbrios e incapaz de feitos, liderou uma gestão de mercearia, mester em que goza de boa reputação e nomeada.

De ódios, amores e fidelidades caninas, o “pater famílias” promoveu acasalamentos fraternos e subiu a lugares de topo jovens que nunca foram a uma entrevista de emprego.

Premiou servilismos e seguidismos acéfalos da corte falida.

Desperdiçou oportunidades e cometeu erros de palmatória. A História e o tempo julgá-lo-ão como o exemplo acabado da oratória inconsequente e da promessa fácil.

Talvez tenha chegado a hora de nos preocuparmos com o caminho, em vez da escolha do meio de transporte.

Nota – PNS, nas suas últimas declarações, foi igual a si próprio, arrogante, ressabiado, impulsivo, cru. Bolsou um vómito: “numa democracia avançada, Montenegro não seria primeiro-ministro“. Subentendido ficou que a nossa democracia não o é. Por esclarecer, ficou a responsabilidade de PNS, uma vida à boleia da política e sem carreira profissional, nesse atraso miserável.

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Publicado em Opinião