O pânico da fuga da guerra…

O ambiente que se vive nas zonas fronteiriças e nas cidades de acolhimento é desolador. Centenas de pessoas, na sua grande maioria mulheres e crianças que, com uma bagagem cheia de nada e subtraídas das suas famílias, saem da sua pátria carregando consigo apenas a esperança de que as tropas invasoras recuem e que um dia possam regressar à sua terra e às suas casas ou, pelo menos, ao que resta delas.

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  • 20:29 | Segunda-feira, 14 de Março de 2022
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Poucos acreditavam, mas aconteceu. Das “inocentes” manobras militares junto à fronteira ao início da ofensiva sobre a Ucrânia foi uma questão de dias. A tensão agudizou-se e a invasão aconteceu, ganhando contornos bélicos que a todos dão motivos para temer o fantasma de uma terceira guerra mundial.

Entretanto, os ucranianos mantêm-se estoicamente firmes na resistência e deixam passar uma serenidade incrível, própria de quem já sabia que isto viria a acontecer a todo o momento.


 

Dada a escalada de violência, são agora aos milhares aqueles que procuram um porto de abrigo fora das suas fronteiras, na ânsia de se colocarem a salvo de mais um inferno na terra. Assistimos, diariamente, a um êxodo crescente de mulheres e crianças ucranianas, fazendo engrossar os índices de uma crise humanitária no velho continente, dos últimos séculos.

 

O número de refugiados ultrapassou já os 3 milhões, mas o Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) estima que esse número possa chegar a 4 milhões. Estes valores ganham contornos de preocupação acrescida se tivermos como referência, por exemplo, aquela que foi considerada, até agora, a maior crise deste género desde a II WW. Falamos do conflito na Síria, onde o número de pessoas em fuga alcançou os 2 milhões num período de tempo mais longo.

Dez anos volvidos e a ACNUR volta a acionar a sua missão fundadora, agora para garantir que os ucranianos em fuga possam procurar refúgio nos diferentes países europeus, algo que está a decorrer a bom ritmo, através de uma simplificação de processos. Quanto mais céleres se tornarem os mecanismos de acolhimento e integração, mais cedo é possível agir no sentido de mitigar o sofrimento destes refugiados que, por força de bombardeamentos ferinos, viram os seus lares destruídos e as suas famílias fragmentadas num tão curto espaço de tempo.

 

 

Com as estradas bloqueadas, constantes bombardeios aéreos e debaixo de fogo de militares armados, a caminhada até à segurança das fronteiras está a tornar-se cada vez mais arriscada. Uma parte substancial destes refugiados têm como destino a Polónia, principal fronteira com o leste europeu. Até à data, mais de meio milhão de refugiados provenientes da Ucrânia pisam já o solo polaco, mas o fluxo destas movimentações continua a registar novas entradas a cada hora que passa.

 

 

A impressionante atitude do país liderado por Andrzej Duda merece um lugar de destaque no reconhecimento internacional. Movido por propósitos solidários, revelou uma capacidade invejável de organização e eficiência na resposta imediata ao desiderato dos refugiados do seu país vizinho, garantindo-lhes condições de acolhimento com o mínimo de dignidade e respeito.

O ambiente que se vive nas zonas fronteiriças e nas cidades de acolhimento é desolador. Centenas de pessoas, na sua grande maioria mulheres e crianças que, com uma bagagem cheia de nada e subtraídas das suas famílias, saem da sua pátria carregando consigo apenas a esperança de que as tropas invasoras recuem e que um dia possam regressar à sua terra e às suas casas ou, pelo menos, ao que resta delas.

Na estação central da Varsóvia, sente-se, por um lado, a desilusão e o pânico da fuga da guerra e, por outro, a esperança de que possa haver um futuro, ainda que este se lhes afigure difícil. Aqueles que se encontram no sorvedoiro do furacão bélico convivem com cenários dantescos, onde tudo se desmorona, tudo se torna frágil, tudo se vulnerabiliza sob o poder do fogo cerrado das armas e onde tudo concorre para a incerteza do amanhã. Mas também testemunham, in loco, a tenacidade, a coragem, o denodo e o sentimento pátrio daqueles que combatem, minuto após minuto, as investidas russas.

 

Portugal juntou-se aos países que oferecem refúgio aos ucranianos e decretou uma proteção especial temporária, com atribuição automática de autorização de residência a esses cidadãos e seus familiares, numa clara demonstração de amizade e solidariedade para com os refugiados desta guerra. Abre as nossas fronteiras a todos os que queiram escolher Portugal como destino de acolhimento. Governo, autarquias, associações, todos os portugueses têm disponibilizado ajuda, juntando esforços nesta missão coletiva, predispondo-se a partilhar o que temos com quem deixou tudo para trás. Portugal, as instituições e os portugueses em geral estão com os refugiados desta guerra. O nosso país, aliás, sempre foi um destino procurado pelo povo ucraniano que aqui encontraram e ainda encontram oportunidades de trabalho. Também por isso, acreditamos que a integração destas pessoas deslocadas decorrerá com relativa facilidade.

Vamos continuar nesta senda compassiva e franquear as nossas portas àqueles que nada mais carregam consigo do que a roupa que trazem no corpo; vamos acolhê-los na nossa sociedade e disponibilizar-lhes condições de vida condigna; vamos ajudá-los a reconstruir as suas vidas, a reconstruir o seu futuro.

Evoquemos as palavras de um dos nossos maiores poetas, e percebamos que, também na esfera solidária, importa “cumprir Portugal”.

 

(Fotos Marta Costa)

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Publicado em Opinião