É fundamental não desanimar

A crise é transversal a toda a população, mas há grupos mais vulneráveis que foram afetados duramente pela destruição do emprego, os estrangeiros e os extremos das franjas de idade da população ativa: a que vai dos 18 aos 24 anos e a das pessoas com mais de 50 anos. Os jovens são impedidos de ganharem experiência e de se autonomizarem, os mais velhos, estigmatizados pela sua idade, são afastados por disfunções do nosso mercado de trabalho.

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  • 12:49 | Quinta-feira, 04 de Março de 2021
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A população empregada diminuiu em 2020, caindo em 99 mil pessoas, um decréscimo de 2,0%. Adicionalmente, a população desempregada cresceu 3,4%, ou seja, 11,4 mil pessoas. Chamo a atenção para as Informações sobre o Mercado de Trabalho, da Comissão Europeia, para o nosso país:

“O número de trabalhadores abrangido pelo regime de “layoff” (total ou parcial) simplificado, medida que visou atenuar o impacto da pandemia no desemprego, ascendeu ao longo deste período a mais de 1,3 milhões de trabalhadores abrangidos (valor que se mantém nos meses de verão) – prevendo-se que uma parte destes trabalhadores possa progressivamente cair em situação de desemprego até final de 2020 / início de 2021.

A previsão da CE tende a concretizar-se, 2021 arrancou com o desemprego a aumentar, assim o demonstram os dados provisórios divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). A taxa nacional de desemprego terá aumentado em janeiro 0,4 pontos percentuais face a dezembro, para os 7,2%.


A crise é transversal a toda a população, mas há grupos mais vulneráveis que foram afetados duramente pela destruição do emprego, os estrangeiros e os extremos das franjas de idade da população ativa: a que vai dos 18 aos 24 anos e a das pessoas com mais de 50 anos. Os jovens são impedidos de ganharem experiência e de se autonomizarem, os mais velhos, estigmatizados pela sua idade, são afastados por disfunções do nosso mercado de trabalho.

Tive o gosto de participar no lançamento do relatório “Portugal, Balanço Social 2020”, projeto desenvolvido pelos investigadores Susana Peralta, Bruno P. Carvalho e Mariana Esteves, do centro de conhecimento Nova SBE Economics for Policy, no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação ”la Caixa”, o BPI e a Nova SBE. Retive três informações que considero relevantes: 1- as crianças integram um dos grupos mais vulneráveis à pobreza; 2 – o risco de pobreza está assimetricamente distribuído pela população; 3 – há fatores muito relevantes que contribuem para a pobreza persistente: a educação, a composição do agregado familiar e o acesso ao mercado de trabalho. Para que possamos eliminar a pobreza persistente e severa, a criação de emprego de qualidade é a chave. A crise que afeta, hoje, muitas famílias, mas causará dano a muitas mais nos próximos meses, na medida em que cessem as moratórias e os layoff, exige uma nova geração de políticas ativas de emprego que possam responder afirmativa e rapidamente às situações geradas pela pandemia. Não é, de todo, despiciendo exigir que seja feito um esforço gerador de pactos multipartidários sem apriorismos sectários, consubstanciados numa densa análise económica e da realidade social.

Há um dado muito relevante, o número de inativos disponíveis, mas que não procuram emprego foi estimado em 192 mil pessoas, verificando-se um aumento de 32,2% (46,8 mil pessoas) relativamente ao período homólogo. Um dos grandes desafios do Estado passa por tomar medidas que contribuam para a manutenção dos empregos existentes, estimulem a criação de novos e contrariem um dos gravosos problemas sociais que se adensou nos últimos meses: o chamado “efeito desânimo”. Há quem seja esmagado pela longa duração da sua situação de desemprego e, nota importante, haverá quem nem se inscreva nos serviços públicos competentes, como o IEFP. Submersos numa realidade kafkiana, sentem-se impotentes para fazer frente aos inúmeros processos de seleção, entrevistas, formações desajustadas, à precariedade dos trabalhos a que acederam ou lhes são propostos…Um dos grupos mais vulnerável é o das pessoas com 50+ anos. Sugiro, para quem possa aceder à Netflix, a serie francesa “Recursos Desumanos” que conta como protagonista, com o antigo craque da bola Eric Cantona.

A comunidade, eu e o leitor, nós, todos juntos, não podemos abdicar dos nossos direitos e deveres de cidadania, exijamos ao Governo que a “VITAMINA”, sempre me pareceu absurdo o termo “bazuca”, sirva para fortalecer os mais frágeis de modo a que possamos eliminar os focos de pobreza que nos devem envergonhar e não para aumentar os ganhos dos habituais “clientes” dos fundos comunitários.

Além da “VITAMINA”, deposito alguma esperança na Presidência Portuguesa da União Europeia que tem como uma das prioridades a concretização o Pilar Europeu dos Direitos Sociais. Estejamos atentos, os primeiros sinais não são animadores. O objetivo passa por ter no início de maio, na Cimeira Social marcada para o Porto, um compromisso mais forte dos 27 para com metas de igualdade, proteção social e inclusão, desenhadas ainda em 2017 pela Comissão Juncker e retomadas no início do ano passado pela nova presidente, Ursula von der Leyen, e que permanecem largamente de adoção voluntária. Atente no seguinte e retire as suas ilações: adoção voluntária das metas; os planos nacionais de recuperação e resiliência, a executar até 2026, não preveem a inclusão das metas que forem fixadas neste plano de ação; 2021 será um ano sem avaliação dos países quanto a progressos alcançados até aqui; não haverá recomendações estruturais aos Estados membros… Não nos deixemos capturar pelo “efeito desânimo”

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Publicado em Opinião