Duas faces da mesma moeda no interior

De tempos a tempos somos “presenteados” com medidas disruptivas para o interior, promovem-se debates, organizam-se movimentos, mas a tendência da litoralização do país mantém-se.

  • 3:33 | Quinta-feira, 09 de Maio de 2019
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Dois jornais de referência – Público e Jornal de Notícias – publicaram, no domingo (05 de maio de 2019), duas reportagens que cunham as duas faces de uma mesma moeda, a desertificação do interior do país:

“Alunos com muitos quilómetros. Sair de casa de noite e voltar fora de horas é um exame diário à resistência. Reportagem no interior profundo.” (Capa da Notícias Magazine, JN)

“Reportagem – Nas terras sem bebés, o vazio dos que ficam e as razões dos que partem” (Público)


Estas foram as manchetes que convidaram à leitura dos dois excelentes trabalhos da autoria de Filomena Abreu (texto) / Artur Machado (fotografia) – Notícias Magazine – e Rita Marques Costa (texto) / Miguel Manso (fotografia) – Público.

Presto-lhes a minha homenagem! São reportagens como estas que não deixam o interior do país ser esquecido e dão a conhecer a dura realidade dos jovens onde ainda existem e dos idosos, em muitas freguesias os últimos residentes resistentes.

“Uma realidade que não afeta só os alunos do básico e do secundário, mas é vivida também pelas crianças do primeiro ciclo e do pré-escolar, uma vez que na ‘maioria das aldeias, as escolas fecharam porque só tinham um, dois ou três alunos. (…)

Haverá meninos que chegam muito tarde a casa e se não fizerem os trabalhos é porque não terão tempo. Muitos deles ainda fazem tarefas, algumas até no campo. Ajudam com o gado, outros têm avós idosos, um acrescento que outros jovens não têm nos dias de hoje. ” (Notícias Magazine, JN)

“Aqui só há velhos e os velhos não podem fazer filhos.

Nas ruas, não se vê uma pessoa jovem. Só idosos que conversam à sombra em pequenos grupos.” (Público)

Uma ideia que ficou clara nos diversos testemunhos recolhidos é a vontade / necessidade, manifestada pelos poucos jovens que ainda aí vivem, de rumarem à cidade mais próxima ou emigrarem. Não há empregos, as escolas foram encerradas, os serviços dos CTT desapareceram, o acesso aos serviços de saúde são difíceis… Estes movimentos migratórios deixam as pessoas mais velhas cada vez mais sós e isoladas e fazem aumentar o número de freguesias onde não nasce uma única criança (há 28 freguesias onde nascem bebés há pelo menos 5 anos).

De tempos a tempos somos “presenteados” com medidas disruptivas para o interior, promovem-se debates, organizam-se movimentos, mas a tendência da litoralização do país mantém-se.

Eleitoralmente, uma das consequências da catástrofe demográfica é a redução do número de votos e consequentemente do pouco interesse destes territórios para os políticos que estabelecem outras prioridades para a sua ação mediática.

Em ano de eleições, renovo a esperança de ver o interior do país e as suas gentes a merecerem uma atenção genuína por parte dos agentes políticos.

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Publicado em Opinião