Desde o “adredemente obnubilado…”

De facto, a língua portuguesa, na sua infindável dinâmica, presta-se a tudo, até às mais absurdas “pescarias lexicais” em prol da originalidade, inovação e pela capacidade de dizer a mesma coisa de várias maneiras.

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  • 14:03 | Sábado, 12 de Novembro de 2022
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O francês Molière (1622-1673), de seu nome Jean-Baptiste Poquelin foi um dos maiores expoentes mundiais da comédia satírica e do teatro.

São muitas as frases extraídas da sua brilhante produção literária. Frases intemporais tais como estas:

“Um tolo que não diz palavra não se distingue de um sábio que se cala.”


“Todos os vícios, quando estão na moda, passam por virtudes.”

“Morre-se apenas uma vez, mas por tanto tempo!”

“As pessoas podem ser persuadidas a engolir qualquer coisa, contanto que venha temperada de elogios.”

“Quando nos fazemos entender falamos sempre bem.”

Sobre esta última, quando encontro por aí fora textos do tipo:

“O emponderamento de …  foi procrastinado para mais tarde, apesar da resiliência de …”, sinto vontade de fazer uma ligeira modificação à frase final:

“Quando (não) nos fazemos entender falamos sempre bem.”

De facto, a língua portuguesa, na sua infindável dinâmica, presta-se a tudo, até às mais absurdas “pescarias lexicais” em prol da originalidade, inovação e pela capacidade de dizer a mesma coisa de várias maneiras.

O semiólogo francês Roland Barthes em “O Rumor da Língua” refere:

“Há linguagens que se enunciam, se desenvolvem, se marcam na luz (ou na sombra) do Poder, dos seus múltiplos aparelhos estatais, institucionais, ideológicos; chamar-lhe-ei linguagens ou discursos encráticos.” (…) “A linguagem encrática é vaga, difusa, aparentemente ‘natural’, e portanto pouco identificável: é a linguagem da cultura de massa (imprensa, rádio, televisão) e é também, num sentido, a linguagem da conversação, da opinião corrente (da doxa): toda esta linguagem encrática é ao mesmo tempo clandestina (não podemos reconhecê-la facilmente) e triunfante (não podemos escapar-lhe): direi que ela é pegajosa.”

 

Pois é o que mais se lê e ouve por aí fora, essa escrita e esse linguarejar “pegajoso”.

E pegajoso é aquilo que cola facilmente, pegadiço, pegajento, pegalhoso, peganhento, peganhoso, viscoso ou… importuno, maçador… (net dicionário).

O “politiquês” e o “economês” são dois bons exemplos dessa linguagem pegajosa, vazia e sem sentido usada expressamente para falar sem comunicar. Ou baralhar.

E por não vos querer maçar mais, por aqui me fico. Bom fim de semana…

… com esta harmónica notícia musical: “Incluindo a interminável Amazónia e o pegajoso Adagio, em arranjo pseudo-erudito combinando cordas e teclados com um meloso saxofone.”

É tudo música…

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Publicado em Opinião