Almirante Gouveia e Melo e Macron…Dupont e Dupond?

Alguns comentadores sugerem que certas dinâmicas recentes em Portugal apresentam semelhanças: sondagens recentes indicam uma elevada volatilidade do eleitorado e a perceção de que figuras independentes ou técnicas podem desempenhar um papel estabilizador perante sistemas partidários enfraquecidos.

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  • 12:49 | Segunda-feira, 01 de Dezembro de 2025
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A presença pública do Almirante Henrique Gouveia e Melo tem suscitado um debate significativo sobre o papel da liderança no reforço das instituições democráticas portuguesas. Embora não reúna consenso, como é natural em sociedades plurais, a forma como conduziu processos complexos, nomeadamente a coordenação da vacinação contra a Covid-19, fez dele um símbolo de competência, clareza e sentido de missão para muitos cidadãos.

Em tempos de incerteza política e desgaste institucional, o percurso do Almirante tem sido associado a rigor, disciplina e previsibilidade. A sua comunicação direta, a recusa do dramatismo e a postura profundamente institucional reforçam a perceção de uma liderança capaz de devolver confiança ao funcionamento democrático. A carreira longa e técnica na Marinha Portuguesa consolidou atributos como método, exigência e foco nos resultados, que para vários observadores representam uma reafirmação do valor do serviço ao Estado, elemento essencial da democracia.

Alguns analistas evocam paralelos históricos para contextualizar este fenómeno. Uma referência frequente é o General António Ramalho Eanes, que, no pós 25 de Abril, destacou-se pela capacidade de restaurar ordem institucional, distender tensões e devolver estabilidade ao regime nascente. A sua postura sóbria, o respeito pelas instituições e a rejeição do personalismo ajudaram a consolidar a jovem democracia. A comparação sublinha o impacto que figuras oriundas das Forças Armadas podem ter quando aplicam a sua experiência ao serviço da estabilidade institucional.


Outros observadores fazem um paralelo com Emmanuel Macron e a experiência política francesa. Macron emergiu politicamente num momento em que o sistema partidário tradicional se mostrava fragmentado e incapaz de dar respostas eficazes a uma sociedade em rápida transformação. Proveniente do espaço social-democrata, conseguiu mobilizar apoios numa eleição marcada pelo desgaste das formações tradicionais. Alguns comentadores sugerem que certas dinâmicas recentes em Portugal apresentam semelhanças: sondagens recentes indicam uma elevada volatilidade do eleitorado e a perceção de que figuras independentes ou técnicas podem desempenhar um papel estabilizador perante sistemas partidários enfraquecidos. Esta leitura interpreta Gouveia e Melo como alguém capaz de organizar e normalizar estruturas, precisamente por não estar associado a vícios partidários e por surgir como independente das máquinas políticas tradicionais.

A relevância pública do Almirante resulta não apenas do seu percurso individual, mas também da forma como o seu nome se cruza com transformações mais amplas que afetam várias democracias europeias. Para muitos setores da sociedade, a sua atuação demonstra que é possível servir a democracia sem recorrer a polarizações excessivas, centrando-se no interesse comum e na qualidade das políticas públicas. Independentemente das simpatias ou reservas, o surgimento de figuras que suscitam reflexão sobre o funcionamento das instituições é um sinal de vitalidade democrática, mostrando uma sociedade atenta às transformações políticas do seu tempo.

 

Paulo Freitas do Amaral

Professor, Historiador e Autor

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