Açores – o dia seguinte

Também no continente vamos para eleições porque o Presidente da República, existindo uma maioria absoluta, decidiu dissolver o Parlamento.

Tópico(s) Artigo

  • 0:09 | Quarta-feira, 07 de Fevereiro de 2024
  • Ler em 3 minutos

As eleições legislativas, realizadas domingo na Região Autónoma dos Açores, permitem retirar algumas conclusões que devem ser bem absorvidas pelos partidos no processo que nos vai levar à eleições legislativas de 10 de março.

A primeira grande conclusão é a que nos diz que os ciclos políticos têm sempre um fim e que não vale a pena tentar prolongá-los.

Vasco Cordeiro é um dos quadros políticos mais relevantes do Partido Socialista, devia ter rumado ao continente para ser ministro de António Costa e permitir que o PS se renovasse e ousasse combater Boleiro com novas e inovadoras formas de construir uma alternativa.


Eu sei que é muito difícil ganhar as eleições e não governar. Mas não há exemplos de governantes, nos últimos trinta anos, que se tenham mantido na oposição a pensar numa nova etapa de governação. O exemplo de Pedro Passos é paradigmático!

Cordeiro fica agora livre para caminhar noutros universos (o PS bem precisa dele) e o PS Açores deve entrar numa nova era de políticas e rostos.

A segunda grande conclusão é a que nos diz que os portugueses não gostam de eleições antes de tempo. Foi assim com Cavaco em 1987, foi assim com Costa em 2022. Sei que não era fácil não ir para eleições perante o chumbo do Orçamento apresentado pelo Governo da Região, sustentado que estava em gente insustentável, mas isso prejudicou o PS.

Também no continente vamos para eleições porque o Presidente da República, existindo uma maioria absoluta, decidiu dissolver o Parlamento.

Claro que as circunstâncias são diferentes, mas os eleitores do centro político não devem esquecer que não foi o PS quem provocou esta crise, foi o Ministério Público e o Presidente da República.

A terceira grande conclusão é a que nos diz que o PS e o PPD não são partidos compatíveis nos traços largos da governação. São projetos políticos alternativos e, por isso, não se podem abraçar em soluções de governo, mesmo que sejam de natureza meramente instrumental.

Há quem diga que o PPD já viabilizou governos do PS. Essa proclamação é muito superficial. É verdade que o PSD de Marcelo Rebelo de Sousa, na década longínqua de 1990, permitiu a aprovação de orçamentos. Mas tal prendia-se com o estado comatoso em que estava o partido laranja depois de uma década de poder absoluto. Marcelo entendeu, bem, que, se derrubasse o Governo, este teria uma maioria reforçadíssima e acontecia com Guterres o que havia acontecido com Cavaco uma década antes.

É por isso que não se antecipa que o PS possa ser o suporte do PSD na governação açoriana e durante quatro anos.

A quarta grande conclusão é a que indica que, quer queira quer não, as direitas tem hoje um elefante na sala. O PPD e Montenegro bem tentaram não dar importância ao facto, mas a governação de Bolieiro ficou mais débil do que a esteve nos últimos quatro anos.

Se antes havia outros partidos que tinham condições de sustentar o Governo, a partir de ontem o PPD Açores só passou a ter um partido, o Chega.

Bem podem os analistas dizer que o PSD e o PS tiveram quase 80% dos votos, mas isso não faz esquecer que o PSD, ganhando, perdeu condições para ter paz política.

A quinta grande conclusão é a que confirma que em 10 de março há mais condições de poder haver um Governo do PS do que um do PSD.

Em primeiro lugar, no continente, a Iniciativa Liberal têm uma penetração que resulta da realidade social do eleitorado no eixo Braga-Setúbal e o Chega, não deixando de ter franjas de descontentes nesse território litoral, alarga a sua influência a distritos com mais de sete deputados, podendo eleger aí parlamentares.

Por outro lado, a esquerda normalizou-se, ficou responsável. Nesta campanha não se vêm ataques do PCP e do BE ao PS e não se vê o PS como um grupo de radicais desmiolados como algumas vozes patéticas anteciparam. O PS continua a ser o partido do centro-esquerda responsável, com fortes preocupações sociais, com um passado que permite, continuando a reorganizar o Estado, responder aos problemas difíceis em que nos encontramos.

Podem perguntar ao PS se viabiliza um Governo do PSD. A possibilidade de isso acontecer é mínima. Foi, aliás, Montenegro quem resolveu a questão de forma cabal ao dizer: “Não vejo forma de viabilizar um governo minoritário do PS” (30.01.2024 – CNN).

Mas é o insuspeito Observador, pela pena de Miguel Santos Carrapatoso e sobre a mesma entrevista, quem escreve: “Desafiado a dizer o que fará caso Pedro Nuno Santos vença as eleições mas exista uma maioria de direita no Parlamento, Luís Montenegro deixa no ar a hipótese de vir a apresentar moção de rejeição ao governo de Pedro Nuno Santos”.

O cenário é bem claro. O que importa é que o país consagre caminhos bem claros, que os partidos digam ao que venham. Por agora só sabemos que o Chega vai continuar a andar por aí e que Ventura não é, no continente, o inenarrável líder dos neossalazaristas das ilhas encantadas. É preciso continuar a combater, sem tréguas, as suas ideias.

Gosto do artigo
Palavras-chave
Publicado por
Publicado em Opinião