A fogueira das vaidades

Mais do que nunca, as feiras bem-sucedidas são aquelas onde se traficam influências, ideias e princípios, se trocam interesses, lugares, cargos. Às escondidas. Nas feiras, as consciências valem tanto quanto um braçado de cebolas e a integridade pesa tanto quanto um molho de brócolos mal-aviado. É triste, mas é a verdade.

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  • 19:17 | Segunda-feira, 17 de Julho de 2023
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São as andanças e as mudanças, quase todas desinteressantes, são as danças e as festanças, quase todas mornas, que dão corpo aos desfiles, engordam cortejos, enchem as procissões. Uma cagança. É a Feira das Vaidades, não mais uma figura de retórica, antes uma figura real e bem instalada.

Quem ainda se prenda a dignidades, tenha algum apego a princípios, e se oriente por valores, revela enorme dificuldade em acompanhar os passos mal calculados e as saídas em falso dos artistas da palavra e dos ilusionistas do compromisso. Uns e outros, feirantes.

Mais do que nunca, as feiras bem-sucedidas são aquelas onde se traficam influências, ideias e princípios, se trocam interesses, lugares, cargos. Às escondidas. Nas feiras, as consciências valem tanto quanto um braçado de cebolas e a integridade pesa tanto quanto um molho de brócolos mal-aviado. É triste, mas é a verdade.


 

 

A gratidão e o reconhecimento são valores esquecidos, requentados, gozados, tratados como miseráveis e vis tentações. A solidariedade e a dignidade são valores permanentemente sacrificados no altar das banalidades. A acomodação, as adaptações, o conforto do silêncio e o apagão das consciências ocupam espaço demais no dia a dia das pessoas, esquecidas, muito cedo, de serem gente. O “safe-se quem puder” é uma regra instalada, e diariamente levada à prática. Os fins justificam todos os meios e moldam os comportamentos dos mais frágeis e vulneráveis, sempre vítimas do abuso e da altivez de terceiros. Os valores exaltados há uns dias, são esquecidos, os princípios em que se acreditava, são ignorados.

Mesmo assim, ainda acredito numa sociedade de homens de convicções, de ideias, de crenças, que não se vendem às promessas, ao poder, que não se deixam seduzir pelo lugar fácil, que resistem às pressões, das mais baixas às mais reles, tanto quanto a imaginação possa seduzir. Acredito numa sociedade em que os homens valem por aquilo que pensam, e por aquilo que defendem, com verticalidade, com entrega, empenho e dedicação. E frontalidade. Acredito numa sociedade em que as pessoas não se dobram, não se hipotecam nem se vendem, a troco de mordomias e vantagens pessoais, em troca de alguns vinténs. Acredito numa sociedade de homens imperfeitos e diligentes, tolerantes, e não de homens iluminados e predestinados. A sociedade dos iluminados, a sociedade dos sábios, é uma sociedade sem alicerces, é uma sociedade de plástico, sem forma e sem futuro. Acredito numa sociedade de homens iguais, mas uma igualdade feita pela diferença, pela diversidade e pela variedade, de opiniões e de opções. Acredito numa sociedade em que os homens podem mudar, movidos pela convicção profunda de que algo de substantivo se alterou, animados por uma ideia séria, e coerente, de mudança, jamais pela razão mesquinha de que mudar é conveniente, mudar dá jeito e melhora o currículo. Continuo a acreditar que os homens são animais vertebrados, com uma estrutura óssea que por mais firme que seja, é sempre mais frágil do que a robustez das consciências e a solidez dos valores.

E continuo a acreditar que os autênticos homens, como as árvores, morrem de pé!

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Publicado em Opinião