O país bom e o país mau

  Na Suécia, há 3 coisas que impedem a corrupção: a transparência dos actos do poder, o alto grau de instrução da população e a igualdade social. Por cá também temos 3 coisas, mas nenhuma faz o mesmo efeito: são o Fado, o Futebol e Fátima. O alto grau de instrução da população e a […]

  • 0:16 | Domingo, 10 de Agosto de 2014
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Na Suécia, há 3 coisas que impedem a corrupção: a transparência dos actos do poder, o alto grau de instrução da população e a igualdade social.

Por cá também temos 3 coisas, mas nenhuma faz o mesmo efeito: são o Fado, o Futebol e Fátima.

O alto grau de instrução da população e a igualdade social demoram gerações a atingir. No entanto, se nunca começarmos, nunca lá chegaremos.


Portugal é um país que procrastina, adia o futuro, enquanto rumina pensamentos mágicos sobre euromilhões, D. Sebastiões brumosos e petróleos nunca encontrados. Aceitar a realidade pequenina e feiinha do país que temos é que não. Que não, pois então.

Gunnar Stetler, promotor-chefe da Agência Nacional Anti-Corrupção na Suécia diz que:

“Se uma pessoa não tem acesso à educação, ela não tem condições nem de compreender e muito menos de fiscalizar o sistema. Na Suécia, acreditamos que uma sociedade se constrói não a partir do topo, mas a partir da base da população. Portanto, é preciso oferecer uma boa educação a todas as camadas da sociedade. “

E diz ainda:

“Quem pune políticos corruptos é a opinião pública. Se um deputado ou um funcionário da administração pública” pratica um ato de corrupção, ele será punido severamente pela sociedade, principalmente por ter cometido um erro a partir de uma posição de poder. Um deputado, por exemplo, pode ser forçado a renunciar através da pressão da opinião pública e da comunicação social, mesmo quando não é indiciado formalmente.”

Já sobre igualdade social:

“Se uma pessoa tem que lutar diariamente pela sua sobrevivência, para ter acesso a alimentação, escolas e hospitais, a questão do combate à corrupção na sociedade certamente não estará entre seus principais interesses. Mas quando uma pessoa se sente parte da sociedade à qual pertence, passa a não aceitar os abusos do poder.”

 

Temos então este pequeno recadinho para as elites portuguesas que botam faladura em jornais e tv´s, lá das cátedras dos condomínios fechados e das belas casinhas:

Não, as pessoas não votam sempre nos mesmos por burrice ou má-fé. As pessoas não gostam de jornais internacionais de referência, canais por assinatura ou papers de circulação restrita por causa de algum gene defeituoso que os faz preferir a bola, a novela e o líder de audiências. As pessoas que lutam diariamente pela sobrevivência fazem as escolhas possíveis, a pastilha anestésica que lhes permite esquecer o facto de amanhã irem ter outro dia igualmente duro como o de hoje. E não devem ser julgadas como se fossem outras, como se pudessem escolher, em igualdade de circunstâncias, o país bom ou o país mau.

Já sobre a opinião pública…

Mas quem pode ter opinião pública num país onde um artigo menos simpático para um banco pode significar menos 3 milhões de euros de receitas de publicidade?

Quem pode ter opinião pública se os jornais e a televisão estão cheios de comentadores que falam em circuito fechado, em que se confunde opinião com informação, onde um jornalista para poder seguir o caso BES teria de ter um MBA, uma especialização em direito e finanças e ainda um batalhão de assessores para o research e já agora guarda-costas?

Quem pode distinguir quem realmente é dono de um jornal, se a informação codificada numa minúscula ficha técnica está cheia de nomes de sociedades anónimas ou grupos cujas siglas não dizem nada ao comum dos portugueses?

Temos portanto a opinião pública qualificada como uma miragem a atingir um dia.

Uma opinião pública que exija transparência nos actos de poder e que perceba que regulação e fiscalização devem ser a sério, não com punhos de rendas e “ai se o xôtor diz que sim , que vai cumprir, então quem sou eu pobre funcionário para duvidar?”.

Até termos massa crítica, Portugal será só um país maravilhoso, mas a caminho. Um país por cumprir, cheio de tiques de novo-rico “ o maior, o melhor, o mais que tudo…” mas, que depois de bem esgravatado, afinal tem professores que dão erros, gestores que se esquecem que gerir é analisar a realidade também, políticos que decidem o nosso futuro e cujo mérito foi apenas o carreirismo jota,  e estatísticas que nos dão 5,2 % de  analfabetos em 2011 mas que escondem um outro analfabetismo, grave, profundo e que se multiplica: o analfabetismo funcional.

Segundo o PNUD (relativo a dados de 2005), 48% dos portugueses não percebem o que lêem ou têm dificuldade em entender parte da informação. Isto deve significar que a nossa Escola é muito boa ou não?

Quase metade dos portugueses não podem portanto formar opinião com base na leitura, quanto mais ler nas entrelinhas.

É pela mudança desta realidade que escrevo, há mais de 20 anos, sistematicamente sobre Educação.

Sou chata eu sei, mas é que eu quero um País Bom.

Para todos, já agora.

 

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