Imaginar, sentir, pensar, actuar, votar!

Agora imagine que tem um vice, mas esse vice é tão fraco politicamente, tão débil, uma nulidade tal, que, caso concorresse seria facilmente rechaçado pela oposição.

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  • 10:03 | Quarta-feira, 08 de Outubro de 2025
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Imagine que é um velho autarca perante o dilema de mais umas eleições. Um dinossauro político, já saturado de comícios, arruadas, bombos e promessas vãs, e que já sonha mais com a pacatez da reforma e com o colo aos netinhos, do que com o prestígio, a fama e a glória de uma carreira política.

Agora imagine que tem um vice, mas esse vice é tão fraco politicamente, tão débil, uma nulidade tal, que, caso concorresse seria facilmente rechaçado pela oposição.

Pense agora que por gratidão ao partido, que tento lhe deu, por amor à camisola, você sentia-se na obrigação, no sacrifício de ter de concorrer a mais um mandato, só para o seu partido não ser humilhado numa estrondosa e expressiva derrota eleitoral.

Imagine agora que elabora um brilhante plano, um fantástico esquema ao melhor estilo maquiavélico, que lhe permite juntar o útil ao agradável: passar os últimos anos de vida no conforto da família, na companhia de quem ama, e em simultâneo oferecer uma última vitória ao seu partido.


Você decide então preparar, organizar um método infalível: concorrer a um último mandato, só para que, passados 1 ou 2 anos possa desistir e, desse modo poder passar a pasta ao seu inútil vice…

Que sentimentos lhe provocaria isso?

Sentiria que estava a instrumentalizar o processo democrático? Que seria uma forma de manipulação do eleitorado, pois os eleitores votam tendo em conta o cabeça de lista, o rosto, a cara da campanha?

Ou sente que, ainda que legal, é uma atitude eticamente reprovável, pois fere a transparência democrática e a confiança na representação política local, uma vez que o voto é o produto de uma relação de confiança entre eleitor e candidato?

Sentiria que quebrar essa relação de forma premeditada é uma traição simbólica dessa confiança, reduzindo a política a cálculo estratégico e não a serviço público?

Ou sente que é um rei numa monarquia, onde o poder se transmite não pelo mérito ou pelo voto consciente, mas por arranjos prévios e continuidades dinásticas.

Que pensaria o leitor? Certamente pensará que, quando partidos ou autarcas tratam os cargos públicos como propriedades herdáveis, reproduzem uma mentalidade feudal num regime que deveria ser republicano e democrático.

Pensaria que, assim, o gesto do candidato que se apresenta apenas como “figura de fachada” para depois ceder o lugar é análogo ao príncipe que assume o trono para garantir que o poder permaneça na família. A política deixa então de ser espaço de escolha pública e passa a ser mero mecanismo de reprodução interna de poder, ao melhor estilo russo Putin-Medvedev.

Ou pensaria que em última análise, este tipo de comportamento enfraquece a própria ideia de República, cuja essência é a rotatividade legítima e transparente dos cargos. Quando o poder se perpetua por sucessão encoberta, o espírito republicano morre – e o sistema democrático transforma-se num simulacro de monarquia, onde os “herdeiros políticos” substituem os reis, e o voto serve apenas para legitimar o que já estava decidido nos bastidores.

Que faria o leitor? Pensava na família? Ou expunha o seu vice e mandava-o fazer-se à vida, submetendo-o ao escrutínio eleitoral, à vontade popular, mesmo sabendo que ia humilhar o partido?

Agiria? Pois um autarca verdadeiramente dedicado à República e ao serviço público deveria escolher a transparência total. O partido deve enfrentar o eleitorado com os seus melhores candidatos, e não com “soluções de fachada”.

Pensaria que se o vice é fraco, o partido tem a obrigação democrática de o substituir por alguém capaz ou, se for essa a sua melhor opção, candidatá-lo e aceitar o veredito popular.

Pensaria que uma derrota humilhante é, nesse caso, uma consequência legítima da fraqueza do seu quadro, e não deve ser evitada através de um artifício que desrespeita o voto consciente?

Ou pensaria que o pior de tudo é o município poder correr o risco de daqui a 2 anos ter um presidente fraco e incompetente?!

Domingo vote. Sem medo. Consciente. Com esperança.

 

Pedro Esteves

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Publicado em Opinião