O momento político atual

Portugal vive num regime semipresidencialista, em que o Presidente tem legitimidade própria resultante de eleição direta e universal. Isso significa que a opinião do Presidente conta, e muito, para a formação de um Governo. Tem poderes para isso e é somente legítimo que os utilize. Perante as decisões muito difíceis que se avizinham, em vários […]

  • 9:08 | Sábado, 14 de Novembro de 2015
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Portugal vive num regime semipresidencialista, em que o Presidente tem legitimidade própria resultante de eleição direta e universal. Isso significa que a opinião do Presidente conta, e muito, para a formação de um Governo. Tem poderes para isso e é somente legítimo que os utilize.
Perante as decisões muito difíceis que se avizinham, em vários tabuleiros (incluindo o Europeu), é muito importante (eu diria decisivo) que quem propõe uma solução de Governo perceba que o apoio maioritário no parlamento tem de ser baseado em compromissos firmes e numa orgânica de funcionamento clara. Sem isso, e com toda a legitimidade, o Presidente pode considerar essa opção muito frágil e, consequentemente, ineficaz. Por isso, pode fazer exigências que obriguem a um maior compromisso e envolvimento formal dos respetivos parceiros na solução governativa. São garantias que os promotores desta solução têm de estar preparados para dar, sob pena de o Presidente, no exercício da sua legitimidade própria, considerar a solução proposta inadequada, ou até menos interessante do que outras que, face à ausência de garantias firmes, voltem a estar de novo em cima da mesa.
Anda muita gente de cabeça perdida, à direita (com a suposta ilegitimidade de uma solução que tem uma maioria parlamentar, dando azo a declarações a total despropósito tal é a falta de serenidade) e à esquerda (tentando afirmar que o Presidente não tem legitimidade para, no exercício das suas funções próprias, avaliar por si as condições de estabilidade de qualquer solução apresentada e as bases do apoio parlamentar que é anunciado), e esta é uma altura em que exige serenidade e capacidade de compromisso. Em democracia faz-se o melhor que for possível, tendo em conta os resultados eleitorais e o superior interesse nacional.
A maioria dos analistas considera que um Governo de esquerda, nas atuais circunstâncias, é sempre melhor do que manter o Governo de Pedro Passos Coelho em gestão até realização de próximas eleições. Dizem portanto que o Presidente não tem margem para outra coisa que não seja nomear, sem mais delongas, o líder dessa solução para formar Governo. Esquecem que o o Presidente pode considerar, com serenidade e ouvindo um conjunto alargado de pessoas e instituições, que isso já não é assim tão verdadeiro se o termo de comparação for um Governo de iniciativa presidencial constituído na área onde está a maioria absoluta do eleitorado: centro, centro-esquerda e centro-direita. Não passaria no Parlamento, dirão muitos, porque a “maioria de esquerda” (PS-BE-CDU) o chumbaria. Não é lícita essa afirmação. Mas, mesmo admitindo que assim aconteceria, o Presidente pode considerar que entre um Governo de esquerda, nas atuais circunstâncias que ele pode legitimamente considerar frágeis, um Governo de gestão de Pedro Passos Coelho e um Governo de gestão de iniciativa presidencial (como acima mencionado), o ultimo seria aquele que daria maiores garantias de compromisso e defesa do superior interesse nacional, no sentido de conduzir o país durante o próximo ano (pelo menos) até à realização de novas eleições. E esta análise é totalmente legítima, não contrariando o que o Presidente afirmou anteriormente. De facto, Cavaco Silva é contra governos de iniciativa presidencial e já deixou isso claro. Mas, no cenário atual, pode considerar que, apesar de não a defender, essa é a melhor opção, pois, e repito, em democracia faz-se o melhor que for possível, tendo em conta os resultados eleitorais e o superior interesse nacional.
É esse o desafio que todos temos entre mãos. Abrir horizontes, considerar todas as opções que a democracia permite, respeitar os resultados eleitorais, e com isso escolher a solução que dê melhores garantias de defesa do interesse nacional.
Consequentemente, quem apresenta soluções governativas tem de desenvolver todos os esforços para reforçar a qualidade e sinceridade dos compromissos que suportam essas soluções, sabendo que o Presidente tem total legitimidade para as avaliar e ponderar aquela que entende ser a melhor solução para o país. É isto que é viver em democracia num regime semipresidencialista.

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Publicado em Opinião