Os crimes de Aguiar da Beira e o jornalismo de "sensação"

    Este horroroso acontecimento que já fez duas vítimas mortais, um elemento da GNR e um civil, e que causou ainda 3 feridos, uma mulher em estado crítico e mais dois GNR’s, é um exemplo paradigmático de alguma da trapalhona e ávida comunicação social que temos. Hoje, 5ª feira, depois dos mais mirabolantes relatos, […]

  • 14:29 | Quinta-feira, 13 de Outubro de 2016
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Este horroroso acontecimento que já fez duas vítimas mortais, um elemento da GNR e um civil, e que causou ainda 3 feridos, uma mulher em estado crítico e mais dois GNR’s, é um exemplo paradigmático de alguma da trapalhona e ávida comunicação social que temos.
Hoje, 5ª feira, depois dos mais mirabolantes relatos, continuando sem se apurar se o presumível criminoso agiu sozinho ou acompanhado, perante os relatos de um jovem major das Relações Públicas da GNR muito pouco claro e refugiado num linguarejar atabalhoado de militar para instruendos, depois de vermos a turbamulta jornalística cair à porta da casa de Arouca, à entrada do Hospital de Viseu, à porta da capela onde jaz o agente da GNR em câmara ardente, fazendo líricas interpretações sobre a urna, continente e conteúdo, após lermos as mais contraditórias intrigas, vermos a repetição exaustiva de imagens, a “gente importante” das redações a fazer um figurão, repito, só hoje, o DN faz alguma luz sobre o assunto e a partir do testemunho prestado pelo militar ferido e entretanto divulgado, referindo que patrulhava com o seu companheiro, pelas quatro da madrugada, na zona das Caldas da Cavaca, tendo deparado com um automóvel conduzido pelo suspeito, identificado como Pedro João Ribeiro e Costa De Pinho Dias,  que estaria, àquela hora, estacionado num lugar ermo.
Escreve a jornalista Valentina Marcelino, do DN, o que citamos com a devida vénia: “
“Dirigiram-se ao carro e pediram-lhe a identificação. Com a carta de condução da mão e quando, via rádio, pedia informações sobre o indivíduo ao posto, viu o colega ser atingido com um tiro na cabeça. Sem tempo para reagir, foi obrigado, sob ameaça de arma, a colocar o corpo do militar já morto no porta-bagagem do carro patrulha. Pedro Dias sentou-se ao volante do carro da GNR e levou-o atado, no banco de trás, até um local, a cerca de cinco quilómetros. Aí retirou-o com violência do automóvel, atou-o a uma árvore e executou-o também com um tiro na cabeça. É nesta altura que surgiu em cena o casal num carro. No local errado à hora errada. O suspeito assassino pensava, nesta altura, que o militar estava morto, mas este assistiu a toda a cena. Segundo terá contado aos investigadores, Pedro Dias agiu com grande rapidez e dirigindo-se ao automóvel abriu a porta, deu um tiro a cada um e levou o carro.”
Daqui para diante pouco se sabe. O segundo GNR foi “executado”, mas viu tudo (perdoa-se a “boutade”… ). Percebe-se mal a “cena” com o casal recém-chegado e vitimado. Ainda pior a fuga na pick-up azul. A de Pedro Dias ou do casal? A “caça ao homem “com 200 efetivos que redundou em insucesso. Ficámos a saber que o suspeito era “boa pessoa”, “educado e respeitador”, “filho de boas famílias, com um pai engenheiro e uma mãe professora”, que tinha cometido “uns atropelos à legalidade, umas aventuras em jovem”, “piloto de aviões”, diziam uns, outros que “andava a tirar a carta de piloto” (vulgo o brevet), que é “divorciado e tem uma filha”, que tem “uma namorada no Sátão que é professora”, que “já foi visto em Trás-os-Montes”, que tem “uma quinta com animais proibidos”, que entre os animais aí apreendidos estava “um primata, da espécie callithrix jacchus (sagui), que foi entretanto entregue ao zoo da Maia, e 52 aves, umas autóctones e outras protegidas pela Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção (CITES)”, que o “padeiro e o peixeiro não apareceram em Candal”, onde fica situada “a capela mortuária, ao lado do cemitério”, que havia “três vítimas mortais”, mas felizmente “ainda” só eram duas… e etc. e tal.
No fundo, talvez as reportagens possíveis, na essência uma mão-cheia de trivialidades e outra mão-cheia de nada.
Helicópteros, drones, cães de busca, agentes especiais, polícia judiciária, bombeiros, autarcas, proteção civil e muitos mais, tornaram a aldeia do Candal numa espécie de Restauradores em hora de ponta…
Perante uma ocorrência mais tragicamente invulgar, assistimos a uma correria feroz à procura do exclusivo, mas pouco centrada no bom rigor e coerência da informação transmitida. É muito mais fácil receber um telefonema do bombeiro “amigo” ou do “agente” conhecido a dizer que houve um acidente no IP3 e correr para lá com o aparato de imagem e microfones…
Lamentamos as vítimas e ficamos a refletir na aberrante violência do sucedido.
Por quê? Quais as motivações ou móbil do crime? Talvez, ao que dizem, para furtar uns quilos de cobre.
No fundo, uma entretecida teia onde a bota parece não bater com a perdigota, neste “bruáá” com imensos decibéis e uma nuvem de  poeira a pairar.
 
(foto DR)
 
 

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Publicado em Editorial