“Quando não nos fazemos entender, falamos sempre bem.” (Molière)

Loquazes, de verbo fácil, com a boca a meio palmo do cérebro, congeminam os circunstanciais dizeres numa eloquência de cliché, também dita de “chapa 5”.

  • 15:41 | Sexta-feira, 03 de Abril de 2015
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Os inconseguimentos e o esoterismo da nossa classe política davam um tratado de ars bene moriendi (o justo passamento) na ars bene dicendi, ou retórica.

Loquazes, de verbo fácil, com a boca a meio palmo do cérebro, congeminam os circunstanciais dizeres numa eloquência de cliché, também dita de “chapa 5”.

A uma primeira figura de Estado pede-se rigor verbal e alguma sapiência oral. Ou então, a mudez dos sensatos, assazmente confundida com compungimento e pavidez do sentir, no sentido da tímida expressão das dores d’alma.


A um ministro marcial, bastante mais dos jurídicos e pugnativos pleitos, pode-se pedir que não faça a simplória e anedótica figura de um trombeteiro barroco, daqueles de bochecha inchada, túmidos beiços na palheta do metal e oco som da tuba. Mas, sem requerimento de exagero, “Silva Lopes ter a felicidade de partilhar este momento (a morte) com Manoel de Oliveira”, faria rir a ambos, pois eram pessoas de fínissimo humor, bem capazes de apreciar tão excelso epitáfio, mesmo em causa própria…

Já do nosso rosto da Assembleia da República, muito mais esteticamente conseguido que os de Jaime Gama ou Almeida Santos, em boa verdade se consinta, nunca seria de esperar nada menos que uma filosófica elocução eivada de uma pitada de ocultismo e só perceptível por um restrito número de discípulos eleitos, achegada ao enigmático e esteiada no impenetrável, prenhe de mística e de erguimento espiritualista, deste tipo:

“Manoel de Oliveira deixa-nos o sublime da sua arte, uma arte que a todos nos libertava na sua infinita perfeição. Como se o cinema que criou, por todos reconhecido, fosse a memória da nossa própria transcendência e o exemplo para a projectarmos nas coisas que fazemos.”

A libertação transcendental do projector… Como a entendemos, preclara A. Esteves… nesta enigmática união entre o infinito e a tela.

Depois destes dois momentos de filigranado recorte, o país ficou sem o que dizer. Só mesmo um “requiem” por Silva Lopes e Manoel de Oliveira, que pode ser de Arvo Pärt… em “Memória de Benjamin Britten”, tão solidamente cheio da beleza que ambos cultivavam e tanto apreciavam.

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Publicado em Editorial