LAMENTAÇÃO SOBRE AS RUINAS DA CAPELA DE S. JOÃO VELHO, VILDEMOINHOS

  Quando, em 1938, o arqueólogo Dr. José Coelho visitava em Vildemoinhos a Capela na altura já designada como de S. João Velho e que o mesmo supõe ter sido anteriormente titulada de Santo António mercê de missa a que obrigava, em seu dia, o instituidor do Morgado, o pequeno e gracioso templo era já […]

  • 21:38 | Quarta-feira, 01 de Julho de 2015
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Quando, em 1938, o arqueólogo Dr. José Coelho visitava em Vildemoinhos a Capela na altura já designada como de S. João Velho e que o mesmo supõe ter sido anteriormente titulada de Santo António mercê de missa a que obrigava, em seu dia, o instituidor do Morgado, o pequeno e gracioso templo era já uma ruina que revelava o abandono de um século, o desastre de um incêndio, incúrias de proprietário, criminosa intervenção do rendeiro que intenta adaptá-la a adega e palheiro e o despojamento do recheio de que restará a imagem do invocado S. João Velho na actual capela da povoação.

De origem tardo-medieval, terá tido como prováveis fundadores antepassados de Gaspar Viçoso da Veiga que ali foi sepultado em 1637 na arca tumular cujo arco-sólio se adossa ainda à parede Sul, integra mediana nave separada por elegante arco-cruzeiro da capela-mor cuja pequenez se enriquecia com a graça das duas edículas de arquivolta de ogiva, um nicho de apoio a alfaias se culto (galhetas?) e um óculo em tempos destruído para abertura de janela de lagar, e está dotada ainda com um coro em cuja parede poente se cravou em 1637 uma lindíssima lápide de pedra de Ançã referindo a avinculação do Morgado com a obrigação de missas de sufrágio dos familiares de Gaspar Viçoso da Veiga.


É de salientar ainda o belíssimo talhe do pórtico voltado a Norte, sobre a fachada principal cujo paramento de impressionante robustez se enriquece quando sobre ele se esbate a dourada luz dos poentes. A arquivolta da elevada ogiva, as impostas e ombreiras molduradas que assentam em bases de cuidada lavra garantem a impar qualidade desta desprezada capela onde, na face Sul, fronteira a esta porta se abre idêntica porta de talhe de ogiva, mais arcaizante que a anterior.

José Coelho integra esta referida Capela na antiga Quinta de Vildemoinhos, hoje mais conhecida por Quinta de S. João Velho. (…) É constituída por casas com capela anexa, terras de monte e férteis terrenos com bastante água, encaixados em um vale ladeado por pitorescos e rendosos castinçais e com belos pontos de vista. Das casas situadas em uma eminência junto à confluência, no Pavia – que corre a N. em fundo e pedregoso vale – de um córrego que atravessa a quinta em fundo e fértil valeiro, disfruta-se um belo e extenso panorama sobre o vale do referido Pavia até ao Caramulo. (Memórias de Viseu (Arredores) I, Viseu, Edição do autor, 1941).

Algo deve ser feito, com urgência, para salvar esta pequena joia do nosso património construído. A singularidade do monumento mercê da ancianidade, da relevância arquitectónica, de uma história familiar a revelar na sua absoluta dimensão garantem-lhe, desde já, o estatuto de classificável como Monumento de interesse, no mínimo concelhio.

Anterior a essa efabulada legenda que faz de 1652 o início da primeira Cavalhada de moleiros que em tal data se socorrem do auxílio divino através da intercessão taumatúrgica de S. João venerado na sua Capela, à Carreira, este monumento poderia integrar esse notável capital simbólico que são as Cavalhadas de Vildemoinhos em associação com uma complementar e necessária mostra da celebrada faina dos moleiros, projecto também a implementar.

Quando, além do mais, se constituiu nas vizinhanças um notável polo museológico, a Quinta da Cruz, potenciadora, com seus tentáculos, de uma singular actividade cultural.

 

NOTA: Não se oferece fácil a tarefa para que apelo, dada a natureza particular de tais bens, a Capela, o casario da quinta onde se incrusta janela de feição quinhentista e outros elementos arquitectónicos da quinta como a Fonte de chafurdo.

Que ao menos se possa limpar com autorização do proprietário, que se possa cobrir de forma a impedir esse pernicioso e voraz desgaste do sol, da chuva, do vento. Até que um novo milagre aconteça, como aquele que se deu há 363 anos. Se fé houver ainda, nos ”moleiros”.

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