“Negócio NelCivil”? – Inqualificável

    Começando pelo início.  Um presidente de Câmara, seja ele qual for, um autarca, não deve e não pode intervir em assuntos que o envolvam directamente. Para ser ainda mais claro, o escritório de Borges da Silva é credor da NelCivil em 12.500 euros. Isso mesmo foi-lhe perguntado em reunião de Câmara mas não houve […]

  • 20:05 | Quarta-feira, 25 de Janeiro de 2017
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Começando pelo início.  Um presidente de Câmara, seja ele qual for, um autarca, não deve e não pode intervir em assuntos que o envolvam directamente. Para ser ainda mais claro, o escritório de Borges da Silva é credor da NelCivil em 12.500 euros. Isso mesmo foi-lhe perguntado em reunião de Câmara mas não houve resposta. Tenta até ao final negar o que é evidente. Uma vergonha. Não esclarecendo sujeita-se a análises porventura excessivas.


Agora que está apresentado para os mais cépticos o homem que preside aos destinos do Município e que dá uma perspectiva da forma como está na vida pública e para que quer manter-se no cargo, permitindo legitimamente extrapolar e duvidar de muitas das suas acções passadas, vamos ao negócio concreto. Borges da Silva propôs comprar umas instalações abandonadas de uma empresa para a qual trabalhou enquanto advogado durante vários anos – a NelCivil.

Para justificar a compra por 250 mil euros, usam-se dois argumentos. Um, inicial e mais frágil, de que era para expandir a zona industrial e um segundo, que serviria para instalar no Concelho um “Centro Tecnológico e Formação Profissional”.

Ninguém no seu perfeito juízo seria contra a instalação de tal “Centro”. Já para que o mesmo sirva de justificação para um negócio que é intrinsecamente mau e que apenas serve para tentar expurgar de sujidade essa vontade de comprar, é preciso ser parvo ou julgar que negócios nebulosos e potencialmente lesivos do interesse público são coisa normal e desculpável.

Vamos a factos para evidenciar o mau negócio que era para a Câmara comprar com este propósito:

1.    A Câmara Municipal de Nelas, em reunião de 27 de Maio de 2016, aprova por unanimidade (embora com alertas vários) uma candidatura de 10 milhões de euros ao Centro2020, com financiamento comunitário de 85%, onde era “de destacar a construção do edifício que albergará o Centro de Apoio Empresarial, cuja a área de construção será de cerca de 1100 m2 e que desempenhará um papel fundamental na dinamização e consolidação de novos investimentos no concelho” (basta ler a acta).

Pese embora as reservas, na altura, todas elas foram desvalorizadas. A CMN, portanto, aprovou por unanimidade o “Centro Tecnológico e Formação Profissional” que seria construído de raiz e financiado a 85%, em caso de aprovação da candidatura. Simplificando seria possível construir uma infraestrutura de, por exemplo, 1 milhão de euros e a CMN apenas despender 150 mil euros;

2.    Comprando este (ou outro) artigo por 250 mil euros estaríamos desde logo a desperdiçar recursos. Imaginemos que a CM teria de gastar mais 100 mil euros a requalificar a “NelCivil” para a transformar no Centro e teríamos 350 mil euros de investimento. Correspondendo a 15% de um investimento comunitário concorrido isto corresponderia a um investimento total de quase 2,5 milhões de euros. Grande “Centro”, não?

3.    Então o que leva o Borges da Silva a optar por gastar 250 mil euros, já, e não esperar pela aprovação da candidatura que ele próprio fez? Cada um faça o juízo que muito bem entender;

4.    A Câmara tem um conjunto de soluções para instalar este “Centro” sem custos de aquisição. Um protocolo a explorar com a EDM para a zona da Urgeiriça ou as antigas instalações da EDP em Nelas. Tudo sem gastar um cêntimo na aquisição. Esquisito?

5.    A ter de comprar (que não tem), houvesse decência e prudência, nunca se deveria optar por algo com o qual se teve uma relação laboral e de credor. Alternativas não faltariam, como por exemplo a CUF em Canas de Senhorim;

6.    Fosse o negócio tão bom, como foi por aí incessantemente apregoado, e seguramente surgiriam mais propostas de compra por valor semelhante ou superior e não apenas a do presidente da CM.

Noutro plano, de somenos quando comparadas com as anteriores, mas que levantam curiosidade quanto à “necessidade” e o empenho de Borges da Silva em comprar estas instalações:

1.    Coloca um texto miserável, da sua autoria, onde coage os vereadores, na prática ameaçando-os de estarem a impedir o desenvolvimento do Concelho se não aprovassem a compra;

2.    Compromete o Secretário de Estado da Indústria quase afirmando que este se teria comprometido com um financiamento ao abrigo da “cooperação técnica do Estado”, mas só no caso desta compra “ser confirmada”. Saberá o Exmo. Sr. Secretário de Estado, disso? Então se o investimento for na CUF, na Urgeiriça ou na ZI1, já não haverá financiamento por esta via? E saberá o Sr. Secretário de Estado que este investimento já foi candidatado ao Centro2020 e que portanto estaria a ser alvo de duplo financiamento?

3.    Remeteu a várias empresas do concelho uma minuta para que estas manifestassem vontade em que o “Centro” fosse uma realidade. Esqueceu-se foi de a enviar aos vereadores que seguramente responderiam todos que sim. Não informou foi as empresas que há soluções mais baratas (como referi anteriormente), sem necessidade de compra, e os pormenores pessoais que envolvem esta compra. Talvez uma referencia ao desperdício de dinheiro que chega à CM por via, por exemplo, da derrama, não fosse despropositada.

A coisa é de tal forma inqualificável, tão mal documentada e nebulosa que, espante-se, o único voto favorável, isolado, foi o de Borges da Silva. O resultado final foram 5 votos contra, uma abstenção, sem declaração de voto, de Sofia Relvas. 

Foi por questões como esta, dúvidas mais que legítimas, que a Comissão Política Concelhia do PS votou maioritariamente não escolher este senhor como recandidato do Partido Socialista às autárquicas de 2017. Foi por questões como estas e porque os políticos não são todos iguais, porque é preciso ser e parecer, que houve a coragem de alertar nos sítios próprios para os riscos de manter alguém assim a gerir os recursos de todos nós. Foi com conhecimento destas questões, que outros escolheram assobiar para o ar e, engalanados em jantares, expressaram o seu apoio numa recandidatura. É por estas e por outras que a política tem pouco crédito e populistas vão enganando os cada vez menos eleitores que se deslocam para votar. É que orientações genéricas, aprovadas em Congresso, nunca podem ter em conta estas “especificidades”.

Mas a responsabilidade é de todos e a ausência e a demissão da luta por aquilo que consideramos essencial, estruturante, identificador, digno, moral e ético, não são soluções. A solução é lutar e denunciar aquilo que nos lesa a todos para beneficio de poucos.

 

 

 

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