A realidade é uma chatice

Tenho acompanhado, com cada vez menor regularidade confesso, a forma como se vão vendendo ilusões neste país, o que é a mesma forma de dizer, a forma como se faz política em Portugal. O meu interesse tem diminuído na exata medida da minha esperança em que isto alguma vez mude. A indiferença e alheamento que […]

  • 23:38 | Sábado, 25 de Julho de 2015
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Tenho acompanhado, com cada vez menor regularidade confesso, a forma como se vão vendendo ilusões neste país, o que é a mesma forma de dizer, a forma como se faz política em Portugal. O meu interesse tem diminuído na exata medida da minha esperança em que isto alguma vez mude. A indiferença e alheamento que observo da generalidade da população, a forma como todos nós nos abstemos de escrutinar e avaliar, e o desaparecimento do jornalismo de investigação, que é uma daquelas poucas atividades com a capacidade de colocar coisas a nu, são fatores de desânimo aos quais não sou também, e infelizmente, insensível. Acompanho de forma breve e menor interesse; o que me aborrece porque é uma atitude que me atira à cara as palavras e os conceitos de impotência e incapacidade, o que está muito próxima de três que retirei do meu dicionário: desistir, acomodar e indiferença. No entanto, tudo o que vejo convida a isso, convida a um jogo de hipocrisia em que cada um pensa em si sem querer saber do que efetivamente estamos a construir, e muito menos do que se passa com os outros. É isso que faz de nós um país subdesenvolvido que regrediu em termos civilizacionais, organizativos e de participação pública, livre e democrática das populações. E foi exatamente o contrário de tudo isto que prometemos todos há 41 anos atrás.
Da minha vida profissional tenho andado pelas empresas e pelo mundo do trabalho. Procuro estabelecer relações com a Universidade de forma a garantir que aquilo que faço tem utilidade e pode ajudar a dar um salto de competitividade. Sempre fiz este tipo de contacto, e considero-o fundamental: procurei desenvolver isso quando estive em funções públicas. Há um discurso e uma forma de pensar que precisa de ser generalizado, pois o país não está, em grande medida, a tirar partido daquilo que é capaz. O que verifico é que muito pouco mudou com a injeção maciça de fundos comunitários. Com a contração da economia (devido à crise), retirando as coisas artificiais que só existem e sobrevivem porque há subsídios, o músculo não se desenvolveu e está, de facto, mais fraco. A forma de pensar, tirando honrosas exceções é sensivelmente a mesma. Não fomos capazes de fazer fluir para a economia e para as empresas grande parte da competência que fomos capazes de criar, nem os recursos humanos valiosíssimos que fomos capazes de formar. Os números do desemprego jovem, do desemprego qualificado e da emigração mostram bem essa triste e penosa realidade. No entanto, no discurso político, do poder e das “alternativas”, nada disto existe, nada disto é um problema, nada disto inquieta de forma a provocar o debate nacional. Não são só os recursos financeiros que foram desperdiçados, pura e simplesmente atirados ao lixo, é também o potencial criado que se desvanece por total ausência de política. E isso é muito desanimador.
Num dos casos que explorei, do qual vai nascer (espero) uma parceria internacional com um contrato de investigação, a empresa em causa está a operar em Portugal (capital americano) e exporta 100% da sua produção. Neste caso verifiquei uma outra forma de pensar, muito crítica e muito realista. Quando levantei a questão de concorrer a fundos comunitários como forma de obter algum financiamento suplementar, a resposta foi um rotundo não. Porquê? “Não queremos nada com subsídios”, muito menos com a forma como são atribuídos e geridos em Portugal. Queremos “parcerias que connosco partilhem o gosto pela inovação, pela capacidade de estar à frente, e pelo risco” sem o vício dos subsídios e da sua gestão absolutamente anacrónica (politizada e para inglês ver). Se não se importa, usamos recursos próprios já aprovados pela nossa administração. Uma atitude que me mostrou um mundo à parte, muito mais realista e focado que precisamos de aprender. Nota: li ontem no Público que a pessoa nomeada pelo Governo para a nova Agência de Desenvolvimento e Coesão, responsável pela gestão das verbas dos fundos comunitários do PT2020, inventou no seu currículo e, tal como o Presidente do Eurogrupo, inventou um Mestrado. O Sócrates inventou na licenciatura e no inglês técnico e o resultado foi aquele que todos sabemos. Aprender com os erros? Naah!

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Publicado em Opinião