Em Viseu, degusta-se literatura com tinto e torresmos de redenho

    Há muito que sabíamos ser este executivo viseense muito dado à cultura. A evidência, porém, saltou aos olhos de todos quando o edil passou a assinar uma coluna no CM, às terças-feiras, sob o genérico “Terras do Demo”, que nunca decerto ignorou ter sido o romance publicado por Aquilino Ribeiro, em 1919, cuja […]

  • 11:15 | Quarta-feira, 23 de Novembro de 2016
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Há muito que sabíamos ser este executivo viseense muito dado à cultura. A evidência, porém, saltou aos olhos de todos quando o edil passou a assinar uma coluna no CM, às terças-feiras, sob o genérico “Terras do Demo”, que nunca decerto ignorou ter sido o romance publicado por Aquilino Ribeiro, em 1919, cuja intriga se desenrola por Barrelas, Sernancelhe e Moimenta da Beira (com alguma boa vontade), ficando assim para a história designado como o território compreendido entre os altos e sáfaros plainos da Nave e Lapa, porque “a vida ali é dura, pobrinha, castigada pelo meio natural, sobrecarregada pelo fisco mercê de antigos e inconsiderados erros e abusos, porque em poucas terras como esta é sensível o fadário da existência.” (Aquilino dixit).
O senhor presidente foi muito feliz no título, pois podia ter escolhido “A Via Sinuosa” (1918), “Caminhos Errados” (1947), “Arcas Encoiradas” (1953), “Humildade Gloriosa” (1954), “No cavalo de pau com Sancho Pança” (1960), ou tantos outros…
Não ignorará ainda decerto o vinho espumante “Terras do Demo”, da cooperativa do Távora, pois além da literatura, este renascentista príncipe florentino, também já deve ser doutor honoris causa em enologia.
Talvez por isso, em prol das letras portuguesas, tenha criado o festival literário de Viseu, “Tinto no Branco”.
Um excelente título, do tipo “rosé”, se misturado, com bom bouquet, apelativo grau e excelente cor. De subtítulo, num jogo metafórico de fino recorte, acrescenta-lhe “A Literatura Posta à Prova”. Essência na qual acreditamos piamente, pois é tudo uma gustativa questão palatal. (Saia “O Crime do Padre Amaro” com tinto Quinta de Tormes e um “Andam Faunos pelos Bosques” com palheto do Freixinho…).
Com Almeida Henriques e Rui Moreira, moderação de Francisco José Viegas, ligam-se os motores, na capela do solar do Vinho do Dão e sai uma reserva de “Os Amores às Cidades”. Provavelmente inspirado, e muito bem, no romance “Amor de Perdição” (1862), CCB.
Depois, na Tenda Branca, Diogo Rocha autoapresenta-se: “Hoje, Diogo Rocha”, com Vítor Sobral e Mário Augusto.
Segue-se, à Lareira, uma Sessão de Magia + “Wine Sense”, pelo Zé Mágico e ESTGV.
Passa-se à Tenda Tinta e abre-se o momento musical com “Soul Orquestra”.
Já pertinho do fim, nas Adegas do Bispo, que devem ser um excelso e báquico espaço, com moderada iluminação, entra o (talvez brejeiro) “Amor às Cegas – Poesia no Quarto Escuro”, com Filipe Vargas, Luís Filipe Borges, Mariano Marovatto e Sónia Balacó, nomes sobejamente conhecidos do público viseense.
O remate, de novo na Tenda Tinta, vai para uma Dão Party, com Jonny Abbey (provavelmente um escritor irlandês ou galês, reconheço minha ignorância).
Lê-se nos prospectos que:
O Festival é o grande destaque vínico de Viseu que combina os prazeres dos vinhos do Dão, da mesa regional e da literatura universal.”
Vou ter de recorrer a “O Cânone Ocidental”, do Bloom, para me situar…
Mas escrevem mais:
No Tinto Branco (ouso retirar a vírgula posta para não separar o sujeito do predicado) haverá grandes nomes para ouvir e muito para aprender sobre os mundos das letras e dos vinhos e as suas ligações.”
Quem duvida desta intergaláctica ligação? Eu, pessoalmente, apesar de ter sido professor de Português e de Literatura durante imensos anos – tantos que lhes perdi a conta – e não obstante ter andado por boas “escolas” públicas lusitanas, admito ser rendido admirador de Camilo Castelo Branco e ter lido qualquer coisa do Viegas (talvez uma crónica em jornal ou um despacho no Diário da República). Quanto aos restantes, estou tão desactualizado – como nesta matéria de tintos, brancos e rosés – que vou pedir ao senhor presidente uma borla, para me reciclar adequadamente.
Nota final: Fez ontem dois anos que a CMV anunciava num quotidiano local “Vai ser criada a confraria infanto-juvenil do Dão” (…) “Destinada a crianças dos 7 aos 12 anos, a confraria uma iniciativa da CMV, entrará em breve no processo de admissão de potenciais confrades.” Previa ainda “entronizar os primeiros 100 confrades” na “próxima Festa das Vindimas”, em 2015. Tenho de confessar, apesar de atento e Confrade da Castanha, que esta entronização me passou ao lado… ou foi mais um “inconseguimento”?

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