A hipérbole verídica

  Ouvi esta expressão a um comentador no contexto das técnicas/tácticas usadas por Trump nos seus discursos, como por exemplo, no da ONU onde referiu com seu de ar de “serious clown” ter feito mais pela paz mundial nos últimos 2 anos do que todos os seus antecessores. Obviamente que a ONU rompeu numa valente […]

  • 12:31 | Quarta-feira, 26 de Setembro de 2018
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Ouvi esta expressão a um comentador no contexto das técnicas/tácticas usadas por Trump nos seus discursos, como por exemplo, no da ONU onde referiu com seu de ar de “serious clown” ter feito mais pela paz mundial nos últimos 2 anos do que todos os seus antecessores. Obviamente que a ONU rompeu numa valente gargalhada…
Também nada nos admira neste domínio da política onde a mentira tem um lugar ao sol e, no concreto caso, estando provado que durante a sua campanha eleitoral, Trump proferiu 76% de falsas declarações. Ele que acusa os jornalistas que não o “lambem” – como agora está muito em moda – de produzirem “fake news”, ou seja, irónica e paradoxalmente, aquelas que denunciam as suas mentiras, são mentirosos.
Estudos feitos nos USA provam sem equívocos que Trump profere uma mentira em cada 5 minutos de intervenção comunicacional.
Um professor da Universidade de Flórida A&M (Michael LaBossiere) afirma que Trump “aperfeiçoou a mentira intolerável como ferramenta de campanha e faz uma declaração claramente falsa ou absurdamente falsa que atrai a atenção dos media, dos quais se aproveita para fazer outra, logo de seguida.”
Quando não mente a cada 5 minutos, profere acusações sem quaisquer fundamentos do tipo: “Para os Estados Unidos, os mexicanos apenas mandam violadores, assassinos e ladrões”. Ou quando afirmou que “81% dos brancos assassinados nos EUA foram vítimas de criminosos negros”, quando, de facto, o número exacto seria de 15%.
Se foi estratégia eleitoral, ela teve sucesso. Porém, hoje constata-se ser ainda mais grave, pois tratar-se-á “de uma verborreia impossível de travar, fruto da sua improvisação e imprudência na hora de falar”. Trump abusa desta táctica das hipérboles ou exageros da realidade, mesmo sabendo, o que é muito mais grave, tratar-se de falsidades.
Nada é de admirar neste indivíduo. Ainda mais quando assume in “The Art of the Deal” (1997) “uma pequena hipérbole nunca faz dano” e “Eu denomino-a de hipérbole verídica. É uma forma inocente de exagero e muito efectiva de promoção.”
Ademais, como muitos políticos – e até gentinha local – Trump sabe como manejar a imprensa, não ignora a sua avidez pelo sensacionalismo e tem a certeza de que a controvérsia dá sempre que falar.
Do geral para a especificidade da nossa política local, vemos a ansiedade de deter meios de CS, a avidez em controlá-la, por “amizade” ou publicidade, o que é hoje, neste contexto, quase sinónimo: “Dás-me muita publicidade, eu recebo muito dinheiro, sou teu amigo e não revelo os teus podres, só propagandeio as tuas virtuosas qualidades.
A hipérbole, enquanto exagero do real, é sempre uma mentira. É por isso que muitos políticos despudorados, nas suas “narrativas epifânicas”, tanto a apreciam.
O mais grave reside na aceitação, como que inevitável, de que a mentira é sempre superior à verdade, na acepção “carneirista” desse facto pelos leitores dela destinatários, na certeza que os emissores têm desse facto e, em consequência, na forma abusiva e cínica com que o usam a seu bel-prazer e dos seus malévolos intentos.
Talvez seja por isso que um bom assessor de imprensa pode chegar a vereador… e sabe-se lá mais onde.

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