A corja

    Enquanto o país arde, milhares de hectares de flora desaparecem e inquantificáveis espécimes de fauna se extinguem, enquanto cidadãos perdem suas terras, seus animais, suas casas, enquanto bombeiros, população, autarcas, de mãos dadas, sem noite nem dia, horas infindas a fio, cinzas nos olhos, poeira nos pulmões, ardor nos corpos, lutam encarniçadamente contra […]

  • 19:45 | Quarta-feira, 12 de Agosto de 2015
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Enquanto o país arde, milhares de hectares de flora desaparecem e inquantificáveis espécimes de fauna se extinguem, enquanto cidadãos perdem suas terras, seus animais, suas casas, enquanto bombeiros, população, autarcas, de mãos dadas, sem noite nem dia, horas infindas a fio, cinzas nos olhos, poeira nos pulmões, ardor nos corpos, lutam encarniçadamente contra o criminoso flagelo que nos assola, o primeiro-ministro, os ministros, os secretários de estado, os demais acólitos de nomeação política procuram outro calor… o das praias, na areia acolhedora de um Atlântico refrescante, bronzeando ao sol doirado.
Um filme a dois tempos, uma realidade pendular onde a desgraça e o alheamento parecem conviver numa dulcificante harmonia.
São estes os mesmos políticos que estão a retemperar os corpos e a aclarar as gargantas cansadas da trauliteirice trombeteada, para no fim do mês de Agosto voltarem à luta. Mas não ao lado de um povo que combate as chamas e que ainda corre à mercearia a comprar água, pão, fruta e leite para os bombeiros, não obstante ter ficado sem os haveres de uma vida inteira de denodada labuta.
Os políticos voltam à luta, com um aspecto doiradinho, em magotes de uma dúzia, alvas camisas engomadas, colarinhos desabotoados, perfumados, envernizados, blazer azul-escuro, unhas recém saídas da manicura, luzidias, a cumprimentar tudo o que bule, a saudar até quem há muito não tem saúde, a prometer que o futuro está nos próximos 4 anos e que Portugal é/está/vai à Frente.
Vendilhões do templo que já venderam do país quanto almejou comprador e que fecham escolas, que geram desequilíbrios socias, precariedade, fragilidade, instabilidade, angústia, pânico, desemprego, emigração…
Os promitentes bombos das promessas ocas estão a chegar. Vêm em bandos ridentes, por feiras, romarias e arraiais, por rádios, televisões, cartazes e jornais a anunciar a boa nova.
“Agora é que é. Amanhã é que será. Dêem-nos a vossa confiança, o vosso voto para acabarmos o pouco que falta para a desgraça total.”
“Ah, os fogos? Epá, de facto isso é uma chatice, mas para o próximo Verão podem estar descansados… Não haverá fogos. Vamos equipar melhor os bombeiros, cadastrar o território, limpar as matas, pôr aviões da FA no ar e actuar no sentido da justa avaliação dos prejuízos em territórios de calamidade pública e nacional e etc. e tal. Contem connosco. Só precisamos de mais 4 aninhos! Estes primeiros foram para retalhar, os próximos quatro serão para remendar…”
País a duas dimensões onde o sofrimento de milhões convive amavelmente com o cinismo de um bando de charlatões.
 
(Foto DR)

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Publicado em Editorial